05 Janeiro 2024
Os plastificantes podem causar distúrbios hormonais, aumentando o risco de defeitos congênitos, câncer, diabetes, infertilidade, distúrbios do desenvolvimento neurológico, obesidade e outras doenças.
A reportagem é de César Fraga, publicada por Extra Classe, 04-01-2024.
Ele está no meio de nós! E não se trata de algo etéreo, mas bem material. Na hora em que alguém tira o lacre de um inocente potinho de iogurte, o conteúdo daquela embalagem já percorreu uma longa viagem antes da colherada levar o alimento para a boca do incauto consumidor.
Depois que o leite sai da vaca e vai para o processamento, seja na etapa da embalagem, de armazenamento ou depois, nas prateleiras do supermercado, em cada parada existe uma chance de um passageiro clandestino entrar escondido na comida. O mesmo vale para outros tipos de alimentos industrializados.
O passageiro indesejado é uma coisa que a indústria de alimentos chama de plastificante. Trata-se de um produto químico usado para tornar o plástico mais flexível e durável.
Hoje, os plastificantes mais comuns são chamados de ftalatos, junto com outros produtos químicos encontrados no plástico, incluindo bisfenóis como o BPA.
Infelizmente, os ftalatos já estão literalmente dentro de nós humanos, em decorrência da ingestão de alimentos industrializados. Esses plastificantes, conforme diversos estudos, têm sido associados a uma longa lista de problemas de saúde, mesmo quando ingeridos em pequenas quantidades.
A ONG norte-americana de proteção aos consumidores Consumer Reports (CR) investigou bisfenóis e ftalatos em alimentos e embalagens de alimentos comercializados nos últimos 25 anos.
Nos novos testes, foi verificada uma maior variedade de alimentos para aferir quanto dos produtos químicos os norte-americanos realmente consomem. A resposta foi: muito.
Testes realizados em uma centena de alimentos revelaram que, apesar das evidências crescentes de potenciais ameaças à saúde, os bisfenóis e os ftalatos continuam difundidos na alimentação das pessoas.
Conforme a ONG divulgou na manhã desta quinta-feira, 4 de janeiro, pelo menos 84 de cada 85 alimentos nos supermercados e redes de fast food que foram testadas recentemente, continham os plastificantes citados.
A entidade também denunciou que 79% das amostras de alimentos continham bisfenol. Foram encontrados o BPA e outros bisfenóis, embora os níveis fossem mais baixos do que nos testes realizados em 2009.
A Consumer Reports disse que nenhum dos níveis de ftalato encontrados excedeu os limites estabelecidos pelos órgãos reguladores dos Estados Unidos e da Europa. Porém, a ONG lembrou que não há nível de ftalatos que os cientistas confirmem como seguro e que isso não garante a segurança dos alimentos que a população consome.
Os ftalatos e os bisfenóis podem interromper a produção e a regulação do estrogênio e de outros hormônios, aumentando potencialmente o risco de defeitos congênitos, câncer, diabetes, infertilidade, distúrbios do desenvolvimento neurológico, obesidade e outros problemas de saúde.
“As descobertas sobre os ftalatos são particularmente preocupantes: o encontramos em quase todos os alimentos que testamos, muitas vezes em níveis elevados. Os níveis não dependiam do tipo de embalagem, e nenhum tipo específico de alimento. Laticínios ou refeições preparadas tinham maior probabilidade de tê-los do que outros”, diz o relatório da ONG.
Níveis elevados de ftalatos foram encontrados em produtos como Cheerios, comida para bebês Gerber e iogurte Yoplait, além de vários hambúrgueres, nuggets e batatas fritas da Wendy’s, Burger King e McDonald’s. A Consumer Reports também encontrou variações entre produtos similares.
Os 33.980 ftalatos em nanogramas por porção no Wendy’s Crispy Chicken Nuggets, por exemplo, eram mais de quatro vezes o nível do Chicken McNuggets do McDonald’s.
“Isso nos diz que, por mais difundidos que sejam esses produtos químicos, há maneiras de reduzir a quantidade presente em nossos alimentos”, afirmou James Rogers, que supervisiona os testes de segurança de produtos da Consumer Reports.
A ONG sugere uma reavaliação da agência de alimentos e medicamentos dos EUA (FDA) e por outros órgãos sobre os riscos dos plastificantes por ser considerada atrasada.
Para a Consumers Reports, os primeiros esforços para limitar a exposição a eles concentraram-se nas embalagens, mas agora está claro que os ftalatos, em particular, também podem entrar a partir do plástico nos tubos, nas correias transportadoras e nas luvas usadas durante o processamento de alimentos, e podem até entrar diretamente na carne e nos produtos através de água e solo contaminados.”
Muitos destes limites não refletem o conhecimento científico e podem não proteger contra todos os potenciais efeitos para a saúde. É o que diz Tunde Akinleye, o cientista da CR que supervisionou os testes da CR. “Não nos sentimos confortáveis em dizer que esses níveis estão corretos”, diz ele. “Eles não são.”
A decisão de permitir esses produtos químicos nos alimentos “não é baseada em evidências”, diz Ami Zota, ScD, professor associado de ciências da saúde ambiental na Escola de Saúde Pública Mailman da Universidade de Columbia, na cidade de Nova York, um estudioso dos riscos dos ftalatos.
Ele dá como exemplo um dos ftalatos mais estudados: o DEHP. Estudos relacionaram-no com resistência à insulina, hipertensão , problemas reprodutivos, menopausa precoce e outras preocupações em níveis bem abaixo dos limites estabelecidos pelos reguladores americanos e europeus. Foi o ftalato mais comum encontrado nos nossos testes, com mais de metade dos produtos testados, e apresentando níveis superiores dos que encontrados na investigação associada a problemas de saúde.
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ONG denuncia presença generalizada de plásticos nos alimentos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU