A perseguição e o assassinato de ativistas sociais é uma marca latente da desigualdade e do sistema oligárquico brasileiro. Em Xapuri, no interior do Acre, numa quinta-feira de dezembro, a 3 dias do Natal, um sindicalista defensor dos trabalhadores seringueiros e da floresta amazônica foi morto com tiros de escopeta no quintal de sua casa. Francisco Alves Mendes Filho, líder do Sindicato dos Trabalhadores Rurais da sua cidade, o Chico Mendes, empreitou uma luta até a morte, desafiando o avanço ruralista na devastação das matas e da vida de milhares de trabalhadores dos seringais.
"Cuando los Ángeles Lloran", música da banda mexicana Maná em homenagem a Chico Mendes
Ao final da tarde do dia 22 de dezembro de 1988, Darly Alves preparava um churrasco em sua fazenda, no aguardo do seu filho Darci, que estava a terminar o serviço que lhe fora encarregado. Invadir a casa de Chico Mendes e assassiná-lo. Pai e filho pensaram e executaram de forma orquestrada um crime que não os envergonha. “Chico Mendes quem se matou foi ele mesmo”, afirmou Darly com empáfia e certeza em rede nacional, para o Fantástico, da Rede Globo, 10 anos atrás. Com razão, Chico Mendes somente morreu porque causou sua morte, “mexeu com todo mundo”, terminou Darly.
“Todo mundo” a quem se refere Darly foram os grandes fazendeiros que arrasavam a Amazônia, destruindo as matas e quem a habitava, entre indígenas e seringueiros; o futuro era para o pasto. Chico Mendes não foi o primeiro, tampouco o único sindicalista assassinado. Porém, seu trabalho à frente do sindicato despertou a atenção internacional para a causa dos trabalhadores da Amazônia, e em 1987 foi premiado pela Organização das Nações Unidas - ONU pela sua defesa da floresta.
Chico Mendes percorria o Brasil denunciando o crescimento das ameaças da UDR. Embarcou na política primeiro pelo MDB, depois da abertura democrática, participou da fundação do Partido dos Trabalhadores. Candidatou-se duas vezes para deputado estadual e, embora ele próprio não tenha sido eleito, seus companheiros de partido e da causa ecológica e dos trabalhadores rurais, Marina Silva e Jorge Viana, conquistaram mandatos e seguem hoje no quadro das principais figuras políticas da região amazônica.
Os 30 anos da sua morte coincidem com as mudanças e os explícitos ataques a ativistas sociais no país. O presidente eleito Jair Bolsonaro já ameaçou “acabar com todo ativismo no Brasil”. Os riscos de desmatamento e as ameaças às populações das matas se acentuam com a força que os ruralistas exercem sobre o novo governo. Luiz Antonio Nabhan Garcia, atual presidente da UDR, foi indicado para a Secretaria de Assuntos Fundiários. O ruralista foi um dos defensores da fusão do Ministério do Meio Ambiente com o da Agricultura.
Embora a fusão não tenha ocorrido, o novo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foi condenado por improbidade administrativa e crime ambiental. Salles foi candidato à Câmara Federal pelo Estado de São Paulo com materiais de campanha que ameaçam aqueles que lutam pelo direito à terra no campo. Para o novo ministro a solução para pessoas como Chico Mendes é a liberação das armas, mais especificamente munição .30.
Os 30 anos da morte de Chico Mendes seguem atuais no Brasil que mata e desmata. O trabalho dos seringais está desvalorizado. Mas a vida dos mais pobres segue sendo ameaçada e exterminada na Amazônia.