21 Outubro 2019
A proposta de um "Rito Amazônico" anima as discussões do Sínodo no Vaticano, que atingiu a metade do percurso com a publicação das síntese das palestras dos 12 círculos menores em diferentes idiomas. De um deles, o Círculo Italicus B, moderado pelo cardeal prefeito da Doutrina da Fé Luis Ladaria Ferrer, surgiu a ideia de seguir esse caminho de um novo rito "que permita desenvolver sob o aspecto espiritual, teológico e litúrgico e disciplinar a riqueza singular da Igreja Católica na Amazônia”.
O comentário é de Salvatore Cernuzio, publicado por La Stampa, 18-10-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
A proposta foi apresentada em uma conferência na Sala de Imprensa do Vaticano por Monsenhor Rino Fisichella, presidente do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização, de quem é facilmente identificável a paternidade da sugestão que, na realidade já havia sido apresentada há alguns anos pelos próprios bispos amazônicos que solicitavam à Santa Sé um estudo sobre o assunto. O projeto permaneceu em stand-by e agora se reapresenta entre as discussões do Sínodo.
É bastante claro que se trata de um artifício que permitiria circunscrever assim as questões mais espinhosas como a do viri probati (evitando, nesse caso específico, que tal "abertura" possa ser usada pelas igrejas de outros países como pretexto para a abolição do celibato sacerdotal). Por outro lado, no entanto, isso seria uma resposta a longo prazo - considerando que o último Rito foi realizado no século XVIII - que corre o risco de fazer com que fique sem resposta ainda por anos aquelas que bispos e missionários da bacia amazônica indicaram como urgências nestes dias de trabalho sinodal. Em outras palavras, esperando que uma teologia indígena seja estudada, que os textos litúrgicos sejam traduzidos e assim por diante, como poderia ser resolvida a questão contingente das comunidades que, por falta de padres, celebram a Eucaristia uma vez a cada dois meses?
Fisichella mostrou-se mais otimista em relação a isso: “Se a proposta for aprovada, tentaremos entender como ela pode ser implementada. Alguns livros litúrgicos já foram traduzidos em ritos amazônicos: há décadas já existe uma reflexão sobre a teologia indígena e sobre uma catequese que pode se desenvolver de acordo com essa orientação. Os ritos são uma expressão de evangelização: quando a proclamação do Evangelho alcança uma cultura, se incultura, ou seja, tenta se expressar nas formas que tal cultura considera mais coerentes para expressar o mistério".
"Na época contemporânea, não temos uma unidade de ritos", ressaltou o chefe do Dicastério, lembrando que, com João Paulo II, "limitado à celebração eucarística", foi concedido um rito especial ao Caminho Neocatecumenal. No caso do "Rito Amazônico", especificou, "somos confrontados por uma proposta que diz respeito ao rito como um todo, como pode ser visto nas citações do Catecismo da Igreja Católica e da Lumen Gentium, orientadas para uma analogia com a globalidade dos ritos das Igrejas do Oriente. No rito bizantino, por exemplo, existe também o sacerdócio uxorado".
Portanto, o debate está aberto, mesmo que a proposta de dar origem a uma "Igreja com rosto amazônico", como defendido pelo Papa Francisco, para expressar o patrimônio litúrgico, teológico, disciplinar e espiritual que pertence a ela permaneça, por enquanto, uma das muitas no papel. De fato, não se pode falar de uma verdadeira discussão sobre o tema na Sala no Sínodo, onde o clima - segundo os participantes - é sereno e dialogante.
Mesmo no caso da questão acima mencionada dos viri probati, a ordenação de homens idosos e casados de fé comprovada para conceder a eles a faculdade de distribuir os sacramentos, não parece criar clima de conflito, como quase deixariam intuir as conversas nos Círculos menores que reúnem opiniões discordantes. Pelo menos cinco grupos se manifestaram a favor de conferir o sacerdócio a "pessoas maduras, respeitadas e reconhecidas, de preferência indígenas, solteiras ou com uma família constituída e estável, a fim de garantir os sacramentos que garantam e sustentem a vida cristã". Tudo isso para atender o desejo das populações amazônicas de "celebrar a Santa Eucaristia de maneira frequente e, possivelmente, estável, como um direito inalienável dos fiéis laicos". O Direito Canônico, também é lembrado na apresentação, "permite que a Santa Sé solicite a dispensa do impedimento ao sacramento da Ordem de um homem legitimamente e validamente casado".
Quatro grupos, por outro lado, buscam outras soluções, como a de potencializar a formação dos leigos, ou objetam que "a proposta poderia reduzir o valor do celibato ou desestimular o impulso missionário para servir às comunidades mais distantes". O grupo italiano B declara sua "perplexidade com a falta de reflexão sobre as causas que levaram à proposta de superar de alguma forma o celibato sacerdotal como expresso pelo Concílio Vaticano II e pelo magistério subsequente".
Finalmente, três círculos derrogam a decisão ao Papa e enfatizam que "em virtude do princípio teológico da sinodalidade" é necessário um "Sínodo universal" dedicado ao celibato, um tema que "deve ser submetido à opinião de toda a Igreja". Hipótese, esta, também defendida por monsenhor Mário Antônio da Silva, bispo de Roraima, Brasil, que falou do celibato como "um dom da igreja a ser considerado um recurso para a graça e o trabalho humano".
Maior unidade é encontrada nos temas de proteção do meio ambiente, sobre o fim da violência contra as populações nativas e sobre a salvaguarda de seus direitos e culturas que têm valor para toda a Igreja e para o mundo.
Também não falta a reflexão sobre o diaconato feminino e sobre "um papel cada vez mais consolidado das mulheres" na Igreja. Portanto, pede-se que "seja conferido o ministério do leitorado e acolitado também a mulheres, religiosas ou laicas, devidamente formadas e preparadas", ou "para criar um novo ministério instituído, de coordenadoras de comunidade", a ser reconhecido "também no nível civil local como representante da comunidade cristã".
As mulheres ainda são objeto de discussão entre os Padres sinodais, além de polêmicas (externas) por sua escassa presença no Sínodo e pela falta do direito de voto. "A atenção às mulheres aumentou à medida que os trabalhos do sínodo progrediam", testemunhou na conferência a freira capuchinha Daniela Adriana Cannavina, secretária geral da Clar. Questionada sobre a questão do diaconato feminino, ela especificou: "Não queremos uma réplica de molde clericalista e nem mesmo um papel de poder. A vida religiosa é o lugar do serviço, não de poder. Mulheres, homens, pastores, consagrados, laicos e laicas envolvidos no trabalho pastoral devem trabalhar juntos para promover o amadurecimento de uma nova eclesiologia, partindo da ecologia integral".
A conferência de imprensa também teve um momento de silêncio que durou cerca de 30 segundos. Foi proposto por Mauricio Lopez, secretário executivo da Repam, como momento de reflexão para entender "qual o olhar de Deus para a realidade da Amazônia".
Durante a conferência, a nota polêmica veio de alguns jornais conservadores que relançaram a questão já colocada ontem sobre os fundos da Ford Foundation, organização aparentemente a favor do aborto e da política de gênero, à Repam e ao Cimi. "A Repam usa doações para promover a vida de crianças, mulheres e famílias", disse Monsenhor da Silva. Enquanto o prefeito do Dicastério da Comunicação, Paolo Ruffini, pôs fim às perguntas que certamente voltariam a ser apresentadas nos próximos dias, sempre sobre a mesma questão, dizendo: "Como cristão e católico, considero bom que dinheiro seja destinado para obras de bem".
Nota de IHU On-Line: A íntegra dos relatórios dos 10 grupos pode ser lida aqui nas línguas portuguesa, italiana e espanhola.
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No Sínodo, a proposta de um “Rito Amazônico”. Divergências sobre padres casados, pede-se uma reunião sobre o celibato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU