09 Mai 2019
Eles divulgaram um comunicado apontando críticas à política ambiental atual. O documento é assinado por Rubens Ricupero, Gustavo Krause, José Carlos Carvalho, Marina Silva, Carlos Minc, Izabella Teixeira, José Sarney Filho e Edson Duarte.
A reportagem é de Filipe Domingues e Elida Oliveira, publicada por G1, 08-05-2019.
Ex-ministros do Meio Ambiente se reuniram na manhã desta quarta-feira (8) na Universidade de São Paulo (USP), na capital paulista, para avaliar a política ambiental brasileira. Em comunicado conjunto, eles alertam que "a governança socioambiental do Brasil está sendo desmontada, em afronta à Constituição".
Encontro dos ex-ministros do Meio Ambiente no IEA (Foto: Leonor Calasans/IEA-USP)
Rubens Ricupero, José Carlos Carvalho, Marina Silva, Carlos Minc, Izabella Teixeira, José Sarney Filho e Edson Duarte fizeram parte do encontro. O documento divulgado por eles tem três páginas e é assinado pelos ministros presentes e também por Gustavo Krause (veja lista abaixo).
"Estamos assistindo a uma série de ações, sem precedentes, que esvaziam a capacidade de formulação e implementação de políticas públicas do Ministério do Meio Ambiente, entre elas, a perda da Agência Nacional de Águas, a transferência do Serviço Florestal Brasileiro para o Ministério da Agricultura, a extinção da secretaria de mudanças climáticas e, agora, a ameaça de 'descriação' de áreas protegidas, apequenamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente e de extinção do Instituto Chico Mendes", diz o documento.
O atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, respondeu às críticas em nota oficial (veja abaixo).
Principais pontos do texto dos ex-ministros:
"Estamos diante de um risco real de aumento descontrolado de desmatamento na Amazônia. Os frequentes sinais contraditórios no combate ao crime ambiental podem transmitir a ideia de que o desmatamento é essencial para o sucesso da agropecuária no Brasil. A ciência e a própria história política recente do país demonstram cabalmente que isso é uma falácia e um erro que custará muito caro a todos nós", diz o texto.
Na visão de Sarney Filho, os possíveis erros da gestão atual podem ser irreversíveis. "Quando você fala de uma obra, ela pode ser reparada. Mas quando fala de floresta não tem retorno", disse. Para ele, o Ministério do Meio Ambiente virou "extensão da Agricultura".
Minc citou como exemplo a criação do parque nacional de Abrolhos, que levou a baleia jubarte a sair da lista de espécies ameaçadas. Ele criticou a liberação da exploração de petróleo e gás na região. "Será que a baleia jubarte vai voltar à lista de animais em extinção?"
Sem formalizar o grupo ou dar-lhe um nome, os ex-ministros pretendem continuar realizando outros encontros esporádicos e, segundo Izabella Teixeira, devem manter uma agenda nacional e internacional para expor os problemas da política ambiental brasileira.
A ex-ministra criticou a falta de diálogo com a sociedade no governo atual. "Não é diálogo virtual, é físico. A palavra tem que ser cumprida". Ela relembrou que o primeiro ministério do Meio Ambiente foi criado em 1985, como consequência da nova democracia do país.
Segundo José Carlos Carvalho, o ministério do Meio Ambiente é uma estrutura para "gestão de conflitos" e, portanto, deve assumir um modelo colegiado e participativo junto à sociedade civil. Nesse mesmo sentido, Minc disse que a gestão atual desqualifica a ação do próprio ministério, pois "o meio ambiente é visto como um obstáculo, algo ruim".
Antes do encontro, Marina Silva disse à imprensa que a preocupação do grupo é em relação à manutenção da estrutura de apoio ao meio ambiente.
Ela criticou medidas da nova gestão da pasta, como a retirada da demarcação de terra indígena da Fundação Nacional do Índio (Funai), que foi para o Ministério da Agricultura, e o fim da secretaria de mudanças climáticas. As consequências do impacto do clima, de acordo com Marina, podem ser percebidas pelo aumento das chuvas e enchentes.
Para ela, os setores do agronegócio, indústria e mineração podem ser afetados pelas medidas tomadas pelo ministro Ricardo Salles.
"O que está sendo dito em relação às nossas commodities é que elas serão produzidas em prejuízo da defesa do meio ambiente, da Amazônia, do Pantanal, da Mata Atlântica, e dos índios. Essa mensagem não pode ser passada em hipótese alguma. Isso gera mais desemprego, mais dificuldades e menos investimentos para o Brasil, e cria insegurança jurídica", disse Marina.
Uma das críticas mais contundentes de alguns dos ex-ministros é a ideia de que o atual governo é "negacionista climático", isto é, que não atribui as mudanças climáticas, como o aquecimento global, à ação humana — noção aceita e demonstrada nas principais conferências internacionais como a COP21, de Paris.
Para alguns dos ex-ministros presentes, como Carlos Minc, ao se aliar com o governo do presidente norte-americano Donald Trump, o governo Bolsonaro aceitou "de forma incondicional" um posicionamento que é "contra o clima". Marina Silva criticou o que chamou de "alinhamentos políticos feitos com o chapéu dos brasileiros, mas sem receber reciprocidade".
O ex-ministro Edson Duarte, que atuou no governo Michel Temer, disse que estão paradas as discussões e os projetos ligados ao Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. "Era para terem se reunido em fevereiro para discutir isso e ainda não se reuniram. Corremos o risco de não ter nenhum projeto aprovado neste ano", afirmou Duarte. Segundo ele, ao fim da gestão Temer havia R$ 200 milhões no fundo.
Em nota publicada na sua conta pessoal do Twitter, o atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, refuta as críticas feitas a ele pelos antecessores.
"O atual governo não rechaçou, nem desconstruiu, nenhum compromisso previamente assumido e que tenha tangibilidade, vantagem e concretude para a sociedade brasileira", diz a nota oficial. "Mais do que isso, criou e vem se dedicando a uma inédita agenda de qualidade ambiental urbana, até então totalmente negligenciada."
O ministro responde pontualmente a algumas das críticas feitas pelos colegas. Ele afirma, por exemplo, que mantém o compromisso "no combate ao desmatamento ilegal, com ações efetivas e não meramente retóricas". Salles diz que o risco de aumento de desmatamento já existe há mais de 7 anos e, portanto, iniciou durante as administrações anteriores.
Ele defende sua gestão, ainda, ao dizer que vem realizando melhorias na estrutura do Ministério do Meio Ambiente ligadas a "fatos e condições também herdadas e oriundas de má gestão e ineficiência de administrações anteriores".
Quem são os ex-ministros que assinaram o comunicado:
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'A governança socioambiental do Brasil está sendo desmontada', dizem ex-ministros do Meio Ambiente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU