11 Outubro 2019
Movidos por preocupações comuns e com uma linguagem desprovida de eufemismos, os sul-americanos que participam do sínodo na Amazônia mostram-se muito determinados para obter aberturas reais.
A reportagem é de Cécile Chambraudin, publicada Le Monde, 09-10-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
A foto é incomum: sentados ouvindo no anfiteatro do Vaticano, os aproximadamente 250 cardeais e bispos usam ternos pretos com golas romanas como o único sinal distintivo. Hábitos e solidéus vermelhos ou violetas foram postos de lado na terça-feira, 8 de outubro, o segundo dia do sínodo (delegados dos episcopados reunidos pelo papa para discutir um tópico específico) da Igreja Católica sobre a Amazônia, mediante autorização expressa do secretário geral do sínodo Cardeal Lorenzo Baldisseri. Fato anedótico por si só, esse vestuário diferente representa, em certo sentido, o vento amazônico que sopra em Roma desde domingo, dia da missa de abertura do sínodo. Os participantes, oriundos na maioria de dioceses amazônicas, não estão presentes apenas para fins de representação. Eles pretendem chegar a aberturas reais que lhes permitam adaptar as práticas características daquele imenso território à situação de crise vivida por seus habitantes.
Bispos, religiosos e especialistas vindos da América Latina têm comunidades de referência, experiências e preocupações comuns. Nascidas de um contexto geográfico e político preciso, nutridas pela teologia latino-americana, caracterizada pelo hábito de compartilhar a experiência, elas se expressam de uma maneira que abala o registro romano habitual, feito de prudência, eufemismos e aversão à mudança. Até o momento, a palavra é dada àqueles que são a favor do movimento.
À sua maneira, Francisco assumiu a tarefa de fazer com que os prelados não amazônicos entendessem que olhar para os povos autóctones de cima para baixo significava não ter entendido nada sobre sua abordagem. "Alguns falam de civilização de segunda categoria", disse ele no discurso de abertura da segunda-feira. E depois existe o desprezo."
Ele relatou aos bispos que ouviu entre eles "um comentário de zombaria" sobre o índio que, pela manhã, em uma cerimônia em São Pedro, havia levado oferendas e usava penas na cabeça. "Diga-me: qual é a diferença entre usar as penas ou o tricórnio que usam alguns oficiais" da cúria romana, ele perguntou cortante.
Segundo uma testemunha acostumada aos sínodos, o tom dos debates (que acontecem a portas fechadas) também é novo. "A atmosfera é diferente. Eles falam como profissionais, que conhecem bem o assunto, como militantes. São muito concretos, menos centrados na doutrina ou na teoria". É verdade que no sínodo sobre a família (2014-2015) ou sobre a juventude (2018), os prelados de todos os países vieram de contextos tão diferentes que dificultaram soluções comuns. Desta vez, a unidade geográfica aproxima os diagnósticos e as propostas.
Os delegados descrevem uma Amazônia em condições muito ruins. E uma Igreja Católica que também não está em sua melhor forma. "Como a onça magnífica que se depara com a extinção de seu habitat, resumiu um dos participantes, o ecossistema eclesial não é mais capaz de despertar e sustentar um número suficiente de vocações sacerdotais e religiosas. Há uma espécie de desmatamento da cultura católica".
Durante as duas primeiras sessões, muitos prelados sul-americanos manifestaram seu desejo de que os seminários pudessem adaptar seus cursos de formação aos indígenas, que frequentemente deixavam seus estudos durante a preparação devido à falta de referências culturais adequadas. Muitos também colocaram a questão extremamente sensível dos "viri probati", homens casados que poderiam ser ordenados sacerdotes para permitir que comunidades distantes tivessem acesso mais frequente aos sacramentos.
Alguns, de fato, permanecem mais de um ano sem ver um padre. Isso leva à convivência os namorados, pela impossibilidade de se casar, disse um orador. As intervenções vindas da cúria, por outro lado, parecem ser claramente mais prudentes quanto a essa proposta, que gera escândalo em certas correntes da Igreja. Algumas Igrejas do Norte "pressentem esse sínodo como um perigo", resumiu Emmanuel Lafont, bispo de Cayenne.
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A Igreja Amazônica sacode o Vaticano, segundo jornal Le Monde - Instituto Humanitas Unisinos - IHU