A queda de Becciu na neblina de Londres: um adeus após um encontro chocante com o papa

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26 Setembro 2020

Existe um único precedente na história bimilenar da Igreja Católica. Abalado pelo caso “opaco” (palavras do secretário de Estado, Pietro Parolin) da compra do edifício de Londres por parte do financista Raffaele Mincione, o arcebispo Angelo Becciu renunciou não apenas ao cargo de chefe do Dicastério para as Causas dos Santos, mas também dos “direitos ligados ao fato de ser cardeal”, começando pelo direito de entrar no próximo conclave.

A reportagem é de Maria Antonietta Calabrò, publicada por L’HuffingtonPost.it, 25-09-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Tudo isso ocorreu depois de um encontro chocante com o Papa Francisco. Resumindo, ele vai deixar a púrpura.

Não se tem memória de um evento tão avassalador para a Cúria Romana e o Vaticano, que também recentemente viu a destituição ao estado laical de outro cardeal, Theodore McCarrick.

No início dos anos 1900, o Papa Pio XI fez com que o cardeal francês Louis Bouyer renunciasse. “Naquele caso – observa o Pe. Davide Scito, professor de Direito Canônico da Pontifícia Universidade da Santa Cruz – foi por razões doutrinais.”

Mas aqui se trata de um caso bem diferente. Becciu foi substituto da Secretaria de Estado por cinco anos também com o Papa Bergoglio (depois de ter sido chamado para esse cargo por Bento XVI). Em síntese, o chefe de gabinete do governo da Cúria. E, depois, promovido a cardeal em 2018.

O encontro com Bergoglio parece não ter sido pacífico, e parece que o Papa Francisco – metaforicamente ou não – deu alguns socos na mesa. O que não é nenhuma surpresa, dado o porte da decisão e a personalidade do agora ex-purpurado, durante anos apontado como um dos emergentes nas fileiras da Cúria Vaticana. Mas dada também a personalidade do papa e a sua decisão em enfrentar os resíduos de uma temporada financeira dentro dos Sagrados Muros.

O caminho de Becciu foi suave e sem percalços durante muito tempo, e depois se envolveu na espinhosa história da compra de um edifício inteiro no bairro mais luxuoso de Londres, à qual se seguiu um confronto com Parolin.

A renúncia – talvez – protegerá Becciu das investigações penais em curso no Vaticano (pelo menos duas) sobre um caso realmente envolvido na neblina de Londres e que se desenrola no tempo até 2012, quando o Vaticano decidiu investir naquele edifício após um importante desinvestimento de cerca de 200 milhões de euros que haviam sido alocados no banco Monte dei Paschi di Siena.

O único comentário do ex-purpurado, confiado à agência AdnKronos, no dia da renúncia, com a voz despedaçada, foi: “Prefiro o silêncio”.

Ao contrário da narrativa alimentada contra Bergoglio de um papado que chegou ao fim, cheio de contradições, relançada também no livro de Massimo Franco publicado pela editora Solferino, intitulado “L’Enigma Bergoglio” (que contém uma defesa de Becciu com uma referência explícita ao caso do edifício da Sloane Avenue), o fato de o ex-cardeal ter que apresentar a sua renúncia ao papa demonstra um fato emblemático, de que, agora, no Vaticano também paga quem está na cúpula.

A investigação iniciada em 2019 por duas denúncias apresentadas pelo IOR e pelo Auditor Geral, levou à suspensão de cinco empregados – dois gerentes da Secretaria de Estado, Vincenzo Mauriello e Fabrizio Tirabassi, uma empregada administrativa, Caterina Sansone, e dois altos gestores vaticanos, Mons. Maurizio Carlino, chefe do Escritório de Informação e Documentação (e ex-secretário pessoal de Becciu), e o ex-diretor da AIF, Tommaso Di Ruzza).

Em junho passado, o corretor de Termoli, Gianluigi Torzi, havia sido preso – e depois libertado – pela Gendarmeria vaticana. Já o financista Mincione “concordou” com a entrega dos seus aparelhos eletrônicos com a Gendarmeria vaticana por meio de uma carta rogatória na Itália.

Mas as investigações tiveram uma enorme aceleração depois que se descobriu que, no início do verão europeu, havia sido apresentada uma oferta para a reaquisição do imóvel para tentar evitar grandes perdas para o Vaticano, uma história contada por Emiliano Fittipaldi, uma tentativa da qual também foram protagonistas um ex-embaixador italiano, um financista estadunidense e Marco Simeon, homem de confiança do ex-secretário de Estado Tarcisio Bertone, além dos velhos protagonistas da história (Mincione, Torzi).

Essa tentativa levantou outras graves interrogações sobre a operação e sobre a entrada e saída de dinheiro para torná-la possível. Há poucos dias, Raffaele Mincione processou o Financial Times, por aquilo que havia sido escrito sobre o caso pelo jornal da City, pedindo que a Corte estabeleça a sua boa-fé.

Becciu era até considerado um dos possíveis papáveis, também havia sido nomeado delegado do papa para a Ordem de Malta, havia sido um dos “saco de pancadas” dos dois Vatileaks sucessivos e nunca escondera a sua oposição à linha do cardeal George Pell, czar da economia no início do pontificado de Bergoglio.

 

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