20 Janeiro 2016
O Papa Francisco foi alvo de críticas por parte de católicos tradicionais com base em que o Vaticano estaria concedendo concessões demais aos protestantes – em especial, os luteranos – no esforço do papa em promover a unidade entre os cristãos.
A reportagem é Stephanie Kirchgaessner, publicada por The Guardian, 19-01-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Os tradicionalistas dizem ser ilegal aquilo o que chamam de “expressões sem precedentes de abertura (...) ao luteranismo”, de movimentos tão aparentemente benignos quanto o apoio do Vaticano em chamar de “Martinho Lutero” uma praça de Roma em sua homenagem, até os comentários feitos pelo papa no final do ano passado em que ele pareceu abrir uma porta aos luteranos para receberem a comunhão nas comunidades católicas.
Uma preocupação maior e uma indignação pareceram alcançar o ponto de ebulição quando, na semana passada, autoridades do alto escalão das igrejas católica e luterana divulgaram um material à imprensa descrito como uma “oração em comum” que deve ser usada nas cerimônias religiosas a marcar o aniversário de 500 anos da Reforma Protestante, movimento encabeçado por Lutero e que dividiu a Igreja.
O monge alemão do século XVI, que acabou sendo excomungado da Igreja, lançou a Reforma em 1517, quando pregou as suas 95 teses na porta de uma igreja em Wittenberg, documento que questionava a venda de indulgências da Igreja Católica em troca de perdão dos pecados.
O Rorate Caeli, blog tradicionalista que frequentemente publica críticas contundentes ao Papa Francisco, disse que a “oração em comum” conta com uma predominância de “materiais protestantes” e “de “louvores em prol da Reforma”, ao mesmo tempo não aceitando nenhuma concessão com elementos da história, teologia e legado católicos.
“O movimento da Reforma e Martinho Lutero são exaltados repetidas vezes, enquanto que a Contrarreforma, os papas e os santos do século XVI são ignorados em total silêncio”, lê-se no blog. “A ênfase esmagadora neste material recai sobre aquilo que supostamente une os católicos e luteranos, enquanto que as doutrinas que nos ‘dividem’ – doutrinas pelas quais inumeráveis mártires católicos e confessores sofreram, deram o seu sangue, combateram e morreram – são omitidas e abandonadas”.
Considera-se que o Rorate Caeli esteja entre os críticos mais linhas-duras do papa. Os seus editores acreditam na restauração da missa latina e se opõem às reformas modernizantes advindas com o Concílio Vaticano II. Em uma postagem recente, o blog se queixou de que os papas modernos “adoram visitar mesquitas e sinagogas”, mas nunca uma missa latina tradicional.
Em novembro, durante uma visita a uma comunidade luterana em Roma, uma fiel luterana perguntou ao papa se poderia comungar com o seu marido católico. Em uma resposta vaga, o pontífice deu a entender que a resposta era sim, com base no fato de que ela fora batizada e que estivesse seguindo a sua consciência, embora tenha dito também que a questão teológica estava fora de sua competência.
Relatando o tema na época, alguns meios de comunicação e o vaticanista Edward Pentin disseram que as palavras de Francisco haviam causado uma preocupação generalizada em Roma, levando alguns comentadores a crer que estavam testemunhando um “ataque aos sacramentos”.
Uma fonte no Vaticano acusou o papa de ter zombado da doutrina, mesmo que o tenha feito de uma maneira “charmosa”.
Os tradicionalistas teriam preferido somente uma única resposta, segundo Pentin: o papa deveria ter dito à fiel luterana que se converta ao catolicismo a fim de comungar. “É um reflexo de como o papa enxerga as demais religiões. É como se não existisse um chamado à conversão e que todas têm o seu caminho a Deus”, falou.
No centro deste debate, segundo Austen Ivereigh, autor de uma biografia do papa, está a convicção de Francisco de que “é sua tarefa criar novos espaços para as igrejas trabalharem e rezarem juntas”.
Francisco não é o primeiro papa a avançar na relação entre católicos e luteranos – incursões foram feitas por João Paulo II e Bento XVI –, porém Ivereigh afirma que o atual papa vem fazendo gestos e ações mais ousados, focando menos nas questões teológicas.
“Nesse sentido, ele se torna profético porque está levando a Igreja para dentro de um território que é novo e está fazendo-o a despeito dos canais tradicionais de diálogo, e é por isso que ele deixa ansiosos não somente os tradicionalistas, mas também muitas pessoas de dentro do Vaticano”, contou Ivereigh.
O papa argentino pareceu reconhecer esta polêmica em uma declaração feita na segunda-feira, 18-01-2016, em uma saudação dirigida a uma delegação de luteranos finlandeses.
“Em nosso diálogo, ainda permanecem algumas diferenças na doutrina e na prática”, disse. “Isso porém não deve nos desencorajar, mas nos impulsionar a prosseguir juntos no caminho de uma maior unidade, superando antigas concepções e reticências”.
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Papa Francisco é criticado por concessões a protestantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU