15 Dezembro 2015
Um acordo histórico, mas fraco. Uma contradição em termos, assim como é contraditório o resultado das duas semanas da COP21 em Paris. Acordo histórico pela sua amplitude, por ser ratificado por 195 nações, quase o globo inteiro, enquanto, por exemplo, o Protocolo de Kyoto de 1997 havia sido assinado apenas por 35 países, com a total ausência daqueles responsáveis pela maior parte da poluição. Mas essa grande adesão também é a sua principal fraqueza, porque o resultado é o de se ter obtido um texto aguado, cheio de bons propósitos, mas muito pouco convincente, evocativo mas vago, e com omissões certamente não ditadas pela distração.
A reportagem é de Claudio Geymonat, publicada no sítio Riforma.it, 14-12-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A conferência havia sido precedida por um grande investimento midiático voltado a sublinhar a sua importância decisiva, o último apelo para salvar o planeta, com a utilização de uma linguagem apocalíptica. Temas há anos no centro das reflexões de muitos grupos ambientalistas, mas também de muitíssimas comunidades de fé, nos últimos meses, pareciam ter se tornado patrimônio comum, com muita passarela de líderes de países responsáveis por desastres ambientais enormes, prontos nas declarações para externar a sua primária e absoluta devoção às campanhas "green".
Justamente as Igrejas, as protestante em particular, colocaram uma enorme confiança no compromisso parisiense e realizaram com convicção muitíssimas campanhas, fizeram peregrinações por todas as partes do mundo, assinaram apelos, subscreveram moções, todas voltadas a implorar que os líderes políticos levassem a sério a questão: justamente nos dias da cúpula, o pastor Olav Fykse Tveit, secretário-geral do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), tinha se dirigido aos ministros e aos chefes de delegações reunidos em Paris em nome de mais de 150 líderes de diversas tradições religiosas – que, em outubro passado, assinaram um apelo entregue ao Christiana Figueres, secretária-executiva da ONU para a Convenção sobre as Mudanças Climáticas.
Em particular, o documento dos 150 líderes religiosos pedia um acordo justo, ambicioso e vinculante, aplicável a todas as nações para eliminar, até a metade do século, as emissões de gases de efeito estufa e a adoção de 100% de energias renováveis para permanecer abaixo de um aumento da temperatura global de 1,5/2 graus centígrados.
Tentamos entrar um pouco nos detalhes do texto final, produzido pelas incessantes mediações de mais de sete mil técnicos, os chamados "sherpas", os trabalhadores dos bastidores, que, depois das bombásticas declarações dos chefes de Estado e de governo, tiveram que trabalhar com cinzel, muitas vezes com picão, na tentativa de fazer a quadratura do círculo.
O que funciona:
- Acima de tudo, funciona o porte global do acordo. O tema da salvaguarda do planeta Terra parece ter feito incursão até mesmo onde nunca tinha sido percebido como prioridade, isto é, nas nações mais ricas e mais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, como China, Índia, Estados Unidos.
- É positiva a referência à já arquiconhecida contenção do aquecimento global bem abaixo dos 2ºC neste século, com esforços para limitá-lo até 1,5ºC.
- São positivas as verificações a cada cinco anos que deveriam fazer um balanço sobre o estado dos trabalhos de cada país, isto é, sobre quanto eles estão fazendo para reduzir as emissões.
O que não funciona:
- Trata-se de um acordo e não de um tratado interacional, por isso não há vínculos obrigatórios. Se fosse um tratado com obrigações a serem respeitadas, a constituição dos Estados Unidos, um dos principais poluidores do planeta, preveria uma necessária ratificação do Congresso, mas que é de maioria republicana, partido cujos líderes estão em aberto contraste com a visão definida como "catastrófica", razão pela qual nunca votariam o texto. Portanto, cabe a cada Estado adequar as suas políticas energéticas de maneira autônoma.
- É ruim que não entre logo em vigor, mas apenas em 2021: muitíssimos cientistas nos explicaram que o tempo já passou amplamente, mas nós continuamos a tomar tempo.
- Parecem pouco claros os mecanismos de controle quinquenais: quem vai implementá-los, como serão articulados?
- O transporte aéreo e o marítimo estão completamente excluídos da obrigação de reduzir as emissões de CO2, e se trata de uma lacuna muito grave, que exclui dos raciocínios os responsáveis por 18% das emissões mundiais. Mas as mercadorias devem poder "circular", gritaram os gigantes da importação-exportação.
- É muito baixo o fundo de 100 bilhões de dólares por ano a serem destinados aos países em desenvolvimento para que possam iniciar políticas centradas nas fontes renováveis e para que possam tomar medidas de contenção dos desastres ocorridos principalmente por causa dos países ricos. Esse valor é considerado uma ninharia pelos cientistas.
- Eis um dos pontos nodais do acordo, o verdadeiro motivo pelo qual a ratificação foi adiada por 24 horas em relação ao previsto: desapareceram as referências aos "loss and damage", as perdas e danos irreparáveis sofridos pelos países vulneráveis por causa das mudanças climáticas causadas pelas nações industrializadas. Removeu-se, dessa forma, toda possibilidade de reivindicação de indenização por parte das nações mais expostas em relação às mais ricas. Sobre esse ponto, Estados Unidos e Europa foram inamovíveis, tanto que o acordo global correu o risco de implodir. Nenhum culpado pelo que aconteceu até agora. Vira-se a página, fomos irresponsáveis, mas agora nos comprometemos, com palavras, de fazer melhor.
- É muito confuso o capítulo reservado aos combustíveis fósseis: desapareceram todas as referências às emissões zero de carvão, petróleo e gás, para o alívio das grandes indústrias e das nações em desenvolvimento que ainda baseiam nelas uma grande parte da economia. Fala-se, agora, em vez de "neutralidade de carbono", de "equilíbrio entre emissões de atividades humanas e remoções de gases de efeito estufa", a ser implementado "o mais rapidamente possível". O equilíbrio pode ser alcançado também com o plantio de árvores que balanceiem a emissão de gases de efeito estufa, mas isso nunca vai ser tão eficaz quanto uma emissão zero.
- São vagas demais as referências temporais: o texto está cheio de frases como "o mais rapidamente possível", "segunda metade do século", com a consequente diluição e vagueza dos compromissos assumidos.
O texto que sai das duas semanas da COP21 levaria a um aumento de 3ºC até 2100, bem acima dos 2ºC ou até dos 1,5ºC postos como objetivo. Portanto, não é suficiente, as medidas não são suficientes. Daí o compromisso a rever os acordos em termos cada vez mais rigorosos a cada cinco anos, mas tudo ficará nas mãos da boa vontade das nações individuais.
O apelo assinado pelos 154 líderes religiosos, incluindo o moderador da Mesa Valdense, Eugenio Bernardini, ressaltava que a "a COP21 oferece uma oportunidade única para contribuir com o bem comum da humanidade, o momento certo para iniciar uma transformação estrutural e individual sem precedentes; os governos não podem se isentar do dever moral de chegar a um acordo sobre os passos concretas e definidos para a justiça climática". Os governos, talvez, não se isentaram, mas fizeram isso com ainda muita timidez.
Os primeiros comentários à queima-roupa refletem a sensação de expectativa frustrada, embora justamente se queira fazer com que prevaleça os auspícios em relação às cassandras: Guy Liagre, secretário-geral da KEK, a Conferência das Igrejas Europeias, saúda o acordo "como um sinal de esperança, um significativo reconhecimento das necessidades globais e das ações comuns a serem implementadas sobre o tema", enquanto Peter Pavlovic, secretário da ECEN, a Rede Cristã Europeia sobre o Ambiente, fala de um "significativo trabalho de implementação que se abre diante de nós. Devemos esperar que as boas intenções do texto serão honradas, e, ao mesmo tempo, todos nós somos chamados a colocar novamente em discussão muitos dos hábitos das nossas sociedades industrializadas".
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COP21, muito barulho por pouco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU