22 Mai 2015
Rudá Guedes Ricci.
DE BOLIVARIANISMOS E LULISMOS
Que a direita brasileira não tem capacidade de formular conceitos teóricos é fato conhecido em todo planeta. Mas, mesmo assim, ela, de tempos em tempos, se aventura neste terreno. Possivelmente, motivado por algum hormônio já citado por Pondé.
No último ano, deram para citar um tal de bolivarianismo, um filho precoce do chavismo. Acreditar em marketing chavista - o tal bolivarianismo - só pode ser coisa de direita, de fato. Aliás, quem dá tanta atenção ao tal Foro São Paulo para além da direita tupiniquim?
Minha intenção com este breve texto é ajudar a direita de meu país a refletir. Espero não deixá-la com dor de cabeça, já que minha ação é motivada pelo bom samaritanismo.
O que seria o chavismo? Uma concepção clássica da esquerda bolchevique, com algum elemento carismático latino-americano. Nada de novo. A base do chavismo, lembremos, é o militarismo, origem funcional de Chavez. Sem este elemento, dificilmente vingaria. Ocorre que em grande parte dos países andinos, o exército possui uma faceta redentora. Este papel foi muito relevante no Peru, em 1968. Chavez soube se valer deste imaginário paternal militarista. A partir desta ponta do compasso fincado em solo mítico, se espraiou para o mobilismo social e para as políticas sociais de alto alcance, mas não emancipatórias. Houve alguma tentativa nesta direção, mas que não superou a organização atomizada em bairros e comunidades. Nas instâncias superiores, o centralismo militarista continuou. A fonte de recursos foi o petróleo, não uma economia pujante e inovadora.
Ora, o lulismo não tem elemento algum desta natureza. Se baseia no neocorporativismo. Este conceito, formulado por Philippe C. Schmitter, sugere que as representações corporativas se insinuam nos escaninhos do Estado, participando de arenas de elaboração de agendas nacionais e políticas públicas. Algo que se aproxima da lógica corporativa do getulismo, mas mais avançado. O lulismo incluiu, ainda, neste modelito, o fordismo de inspiração rooseveltiana, aquela onde há concentração orçamentária e formulação de políticas nacionais que se multiplicam em território nacional via convênios com entes federativos. Não há mobilismo algum, já que as organizações de representação estão inseridas na lógica de Estado, em arenas formais ou mesmo em conselhos, como o CDES. A fonte de financiamento foi, desde 2003, os investimentos produtivos externos.
Quando Dilma decidiu alterar a lógica de financiamento para o arranque produtivo (e de produtividade e invenção tecnológica), deu com a cara na parede. Primeiro, porque o mundo mergulhou numa crise de investimentos que atingiu até a China, nosso parceiro para toda hora, que só agora retoma timidamente o talão de cheques. Mas teve, também, a inércia do empresariado brasileiro, afeto ao patrimonialismo e muito pouco vocacionado ao risco. Vejam o caso dos "empresários" da comunicação que não conseguem viver às custas da venda de um bom produto. Precisam da ajuda providencial e paternal do Estado central. A proposta de campeões setoriais do BNDES alimentou o ódio empresarial tupiniquim e o ressentimento tanto que, quando um dos seus pares mais vistosos, Eike Batista, foi abatido no seu voo de cruzeiro escoltado por jatos governamentais, foi atacado como um filé aos famintos animais privados das benesses estatais.
Enfim, bolivarianismo não tem relação alguma com o lulismo. Aliás, disputaram, palmo a palmo, a Argentina, a Bolívia, o Equador, e a América Central. Na América Central, o lulismo se deu bem. A equipe de Evo Morales me confidenciou, uma vez, no México, que ele tinha Lula e Fidel Castro como orientadores, mas desconfiava de Chavez. Cuba, este amuleto da esquerda que ficou no século XX e da direita brasileira (que continua no século XIX), é só cortejada como a visita ao Museu da República no Rio de Janeiro. Aliás, interessou ao lulismo quando os empresários brasileiros perceberam que a abertura econômica poderia gerar alguns dividendos ao país do futebol. Mesmo assim, a direita-que-não-quer-pensar brasileira ficou de beicinho e até alguns empresários mais sonolentos entraram neste discurso revanchista que o investimento num porto em Cuba era motivada pela longa amizade, desde criancinhas, entre Lula e Fidel. Justamente Fidel, aquela imagem do cavaleiro de triste figura que até hoje sustenta que os EUA querem invadir o Brasil.
Eu tenho para comigo que o dia que a direita brasileira pensar e elaborar de fato, vai se redimir e se tornar esquerda.
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