Gladiador do Altar rechaça acusações e diz que grupo 'ajuda a quem precisa'

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12 Março 2015

"Só temos o desejo de fazer a obra de Deus", disse à BBC Brasil o motorista de ônibus Marcelo*, de 25 anos, membro do grupo Gladiadores do Altar da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd).

A reportagem é de Camilla Costa, publicada por BBC Brasil, 10-03-2015.

Na semana passada, vídeos que mostravam apresentações do grupo de jovens em templos evangélicos em diversas cidades brasileiras causaram polêmica nas redes sociais. Usando camisas verde-musgo, jovens marchavam para o interior dos templos e entoavam uma oração em tom marcial.

Ao serem perguntados pelos pastores "o que queriam", os autodenominados gladiadores respondiam, com uma saudação militar: "o altar! o altar! o altar!".

Em seu perfil no Instagram, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) descreveu o grupo como "milícia" e comparou a iniciativa da Iurd a grupos radicais islâmicos.

"Quando começarão a executar os 'infiéis' e ateus e empurrarem os homossexuais de torres altas como vem fazendo o fundamentalismo islâmico no Oriente Médio?"

Páginas e postagens relacionadas aos Gladiadores do Altar no Facebook foram inundadas de comentários que os comparavam a milícias nazistas e ao grupo jihadista autodenominado "Estado Islâmico".

Marcelo foi o único entre gladiadores e pastores contactados pela BBC Brasil em diversos Estados – e também em outros países – que se dispôs a falar sobre o grupo. Os demais chegaram a responder ao contato, mas se recusaram a dar entrevistas.

No entanto, o jovem pediu para não ter seu nome nem sua cidade divulgados, por temer retaliações. "Não quero me prejudicar, nem prejudicar a Igreja Universal. As pessoas que eu conheço não vão gostar (da entrevista)."

Perguntado sobre o motivo de não ser permitida a divulgação de detalhes sobre os Gladiadores do Altar, Marcelo hesitou e respondeu que "preferia não comentar sobre isso".

Vídeos de apresentações provocaram comparações com grupos jihadistas e nazistas

Em entrevista por telefone, ele se mostrou indignado com os comentários e afirmou que "tudo o que esse Jean Wyllys falou é mentira".

"Primeiramente, eu não gosto desse cara, ele sempre quer posar de bacana. O nosso trabalho na Universal não é nada disso que esse babaca falou", disse. O motorista, no entanto, admite que não chegou a ler os comentários de Wyllys, apenas uma nota da Igreja Universal em seu site, que respondia às declarações do deputado.

A instituição chamou de "interpretações absurdas" os comentários em portais e redes sociais e afirmou que Wyllys uniu "seu ódio à burrice motivada e fez uma avaliação sobre um projeto do qual nada sabe a respeito, e sequer procurou saber antes de publicar tal injúria".

'Palavra de fé'

Marcelo diz ter ingressado no Gladiadores do Altar em sua cidade no início de janeiro. "Nosso trabalho na Universal é o de ajudar as pessoas que mais necessitam, ou seja, aquelas pessoas que estão sofrendo, como um dia eu sofri e a Universal me ajudou muito."

Ele já fazia parte da Força Jovem Universal, grupo da Iurd que realiza atividades religiosas e de socialização com jovens que eram usuários de drogas. "A gente trabalha com jovens que estão desacreditados na sociedade", afirmou.

De acordo com o rapaz, os Gladiadores do Altar são "jovens sendo preparados para futuramente ser pastores". Por isso, segundo ele, as mulheres não podem participar do grupo, já que a Igreja Universal não permite que mulheres se tornem pastoras.

Marcelo não sabe afirmar, no entanto, quais serão os próximos passos para que ele se torne pastor.

Em nota à BBC Brasil, a Igreja Universal disse que o programa procura "auxiliar os jovens que se sentem vocacionados para o trabalho missionário" e que já são 4,3 mil participantes em todo o Brasil – todos homens com até 26 anos de idade.

As reuniões do grupo acontecem todos os domingos. Nos encontros, segundo Marcelo, "o pastor dá uma palavra de fé para nós".

O participante não soube explicar o porquê de a apresentação registrada em vídeo se assemelhar a rituais militares, mas disse que o mesmo ritual é feito durante os encontros. No início das reuniões, segundo Marcelo, os membros do grupo fazem exercícios de aquecimento. Questionada sobre o motivo, a Igreja Universal não respondeu.

A Iurd afirma que o uniforme usado pelos gladiadores consiste apenas da camisa verde-musgo vista nas apresentações, que contêm os símbolos do grupo e da Força Jovem Universal.

Marcelo diz, no entanto, que o resto da indumentária também é padronizada – mas longe de coturnos e camuflagem militares, os "gladiadores" devem usar calças e sapatos sociais pretos.

O ritual registrado nos vídeos polêmicos era, segundo a instituição, uma apresentação do projeto, com "coreografia ensaiada para marcar festivamente a ocasião". No entanto, a Universal afirmou que eles não acontecerão novamente em nenhuma das cidades. Marcelo disse não ter sido informado sobre a decisão.

No último domingo, o encontro de seu grupo aconteceu normalmente.

Preconceito e cautela

Depois que a Igreja Universal do Reino de Deus divulgou nota condenando as críticas à apresentação dos Gladiadores do Altar, diversos vídeos e comunidades sobre o tema foram deletados do Facebook.

A instituição afirmou que os vídeos foram tirados do ar porque foram "mal interpretados por algumas pessoas preconceituosas" e chamou de estúpidas as comparações com grupos nazistas e jihadistas.

Para o professor da UFRGS Marcelo Tadvald, doutor em Antropologia Social e especialista em estudos da religião, houve, de fato, uma "leitura apressada" dos vídeos, motivada pelo preconceito em relação à Igreja Universal.

"Existe uma má vontade dos setores mais progressistas com evangélicos, principalmente com a Igreja Universal. Qualquer coisa que eles façam vai gerar algum tipo de debate e crítica. Ao mesmo tempo, a Iurd dá margem a que essas posições se radicalizem a partir de iniciativas como essa performance, em um momento como esse", disse à BBC Brasil.

"Tem uma frase que eu gosto muito: não podemos combater a intolerância com intolerância. E também não podemos combater algo que ainda nem sabemos se é intolerância dessa forma. É um terreno complicado e é um grande desafio. Gostamos muito de exaltar a pluralidade e a multiculturalidade, mas parece que isso tem limites. E o que determina esse limite?"

O ritual escolhido para a apresentação dos jovens – camisetas verde-musgo, marcha e continência – contribui para o "choque" nas redes sociais e para a associação com "fascismo" em um momento em que "a sociedade tem voltado muito a atenção ao fundamentalismo religioso", de acordo com o professor.

Tadvald, no entanto, considera exagerada a ideia de um "exército fundamentalista" evangélico, e lembra que há iniciativas semelhantes dentro do cristianismo, como os Legionários de Cristo, grupo católico criado no México em 1941.

"Neste momento, acho que isso é um exagero. Mas a questão principal, que é preciso acompanhar, é como esses jovens (os 'gladiadores') perceberão essa atividade. Em um dos vídeos, o pastor conclama os jovens a 'entregar a vida ao combate do mal'. Tudo bem, mas no que consiste esse mal?", indaga.

"Sabemos que a Igreja Universal, assim como outras denominações evangélicas – mas nem todas, é bom que se diga – promove práticas que reconhecemos como intolerância religiosa - contra religiões afro - e também social - contra grupos como homossexuais e até mulheres."

"A Igreja diz que este é um grupo ligado à Força Jovem, que promove atividades culturais e sociais, e eu acredito nisso. Mas alguns grupos fundamentalistas começaram de maneira estruturada a partir de uma liderança religiosa e depois fizeram interpretações próprias e tomaram iniciativas próprias. Será que a igreja tem um controle absoluto sobre isso? Não quero ser alarmista, mas é de se pensar."

*A pedido do entrevistado, seu nome foi trocado.

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