10 Novembro 2014
A mole de documentos inquietantes, publicados em Chicago sobre os abusos cometidos pelo clero entre os anos 1950 e 2010, é uma sinal de alarme para o Vaticano. Além do empenho pessoal do Papa Francisco – evidenciado pela decisão de submeter a processo penal o pedófilo ex-núncio na República dominicana Jozef Wesolowski – essa situação repropõe a questão da grande disparidade existente de uma nação a outra, mais precisamente, de uma conferência episcopal à outra, nas estruturas para contrapor-se às violências contra meninos e meninas. A especial comissão anti-abusos, formada pelo Papa, vai a relento. Houve alguma reunião, mas até agora não foram elaboradas linhas condutoras, que organizem em nível planetário as modalidades para acolher as denúncias, indagar sobre os delitos e ressarcir as vítimas.
A reportagem é de Marco Politi, publicada por Il Fatto Quotidiano, 09-11-2014. A tradução é de Benno Dischinger.
A Igreja tem muito a recuperar. Por que os Estados, enquanto tais, não têm praticado sistematicamente uma política de assoreamento quando um professor ou um treinador praticavam atos de pedofilia. Não existiam prefeitos que transferiam silenciosamente o professor ou o treinador de uma escola ou de uma academia a outra. Não existiam denúncias que andassem misteriosamente perdidas nos meandros do ministério da Justiça ou na corte de Cassação. Não havia criminosos agraciados in extremis, como por exemplo o fundador dos Legionários de Cristo Marcial Maciel – obrigado somente por Bento XVI a uma vida retirada e de prece – ao qual foi perdoado o processo eclesiástico.
Na Igreja, ao invés, a partir da virada indicada por Ratzinger com sua Carta aos católicos da Irlanda, trata-se de desmantelar uma práxis secular de cobertura dos abusos e de criar organismos precisos aos quais as vítimas possam dirigir-se para obter justiça. Muito se fez nestes anos, muito ainda fica por fazer. Há países nos quais há organismos funcionando. Tomemos os Estados Unidos, onde Dom Blase Joseph Cupich se tornou há poucas semanas arcebispo de Chicago, sucedendo precisamente o cardeal George: no interior da conferência episcopal estadunidense Cupich é presidente da Comissão para a proteção dos menores.
Também em outras nações, por exemplo, na Alemanha, existem organismos do gênero. Na Polônia há um Centro para a tutela dos menores, criado pelo episcopado. A Itália está entre os países onde a conferência episcopal – quanto a estruturas específicas de ajuda às vítimas – continua a omitir-se. A assembléia da CEI se reúne amanhã em Assis, discutirá sobre a formação do clero e certamente também quanto à sensibilização sobre o tema da relação com os menores. Mas, sobre centros de escuta para as vítimas e de empenhos para os ressarcimentos a CEI continua tenazmente a não falar.
Diz respeito precisamente à comissão vaticana anti-abusos elaborar os procedimentos mais eficazes para enfrentar o fenômeno, dando ao Papa os instrumentos operativos para impor uma linha uniforme válida para a Igreja católica em cada nação. As poucas reuniões, organizadas de março em diante, (quando o organismo foi constituído) e as relações via email entre os membros do grupo, não asseguram, todavia, rapidez aos trabalhos.
Em setembro o Pontífice nomeou como secretário da comissão o americano Robert Oliver (já promotor de justiça, isto é, “ministério público”, no Santo Ofício) para dar impulso à iniciativa. Mas, até hoje nada foi produzido. E os escândalos ameaçam e clamam.
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Vaticano e pedofilia: belas palavras, poucos fatos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU