Por: André | 04 Agosto 2014
O Prêmio Nobel de Economia criticou os fundos abutres e o juiz Thomas Griesa e destacou a necessidade de criar um mecanismo legal para proteger os países soberanos da ação dos fundos especulativos.
A reportagem é de Sebastián Premici e publicada no jornal argentino Página/12, 02-08-2014. A tradução é de André Langer.
“Necessitamos de um sistema global para a reestruturação de dívidas”. Com este título, o Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz publicou, na sexta-feira, um artigo de opinião no The New York Times no qual questionou a ação dos fundos abutres e as diferentes resoluções da Justiça norte-americana que beneficiaram os especuladores dos fundos NML Capital e Aurelius, entre outros. “Os fundos abutres – um pequeno número de credores que ficaram fora da reestruturação da dívida argentina – não tinham nenhum interesse no país ou em sua população. Recolheram seus bônus em baixa, com a esperança de que ao gastar o suficiente em litígios legais, finalmente encontrariam um juiz compreensivo, que não entendesse o que se estava debatendo e sentenciasse a seu favor”. Esta é a contundência da reflexão do ex-chefe de economistas do Banco Mundial e atual professor da Universidade de Columbia. Além das diferentes apreciações sobre a ação dos fundos abutres, a chave deste complexo processo está na necessidade de criar uma arquitetura legal para proteger os países soberanos da ação dos abutres.
“A crescente complexidade do mercado financeiro torna mais difícil os países em desenvolvimento se libertarem do peso da sua dívida externa, o que produz um aumento da desigualdade em escala global. Os abutres invocaram o império da lei, mas devemos ser claros: trata-se de cobiça. Ao argumentar que todos os investidores devem ser tratados da mesma maneira, socavaram o império da lei e conseguiram que as reestruturações da dívida fossem quase impossíveis”, explicou Stiglitz.
O economista da Universidade de Columbia foi uma das vozes que se levantou contra as sentenças da primeira e segunda instâncias da Corte de Nova York ao erigir-se como amicus curiae diante da Suprema Corte dos Estados Unidos. Na quinta-feira, dia 31 de julho, mais de 100 economistas de diferentes universidades e centros de pesquisa do mundo inteiro enviaram uma carta ao Congresso norte-americano para solicitar a redação de uma legislação específica sobre reestruturações de dívidas. Estes pronunciamentos estão em sintonia com as declarações diplomáticas dos países da Unasul, dos Brics, do G-77 e da OEA.
“O Fundo Monetário Internacional propôs a criação de um sistema mundial de reestruturação de dívidas na época do default da Argentina, em 2001, e a Comissão das Nações Unidades de Especialistas, da qual eu era o presidente, reiterou o pedido para a criação de um sistema deste tipo em 2009. O governo dos Estados Unidos vetou a iniciativa. E agora, os tribunais dos Estados Unidos fizeram deste problema algo muito pior”, recordou Stiglitz.
As reformas dentro do FMI foram propostas por Anne Krueger. Para que este organismo possa aprovar as modificações de seus regulamentos ou um esquema de reestruturação da dívida necessita-se de 85% do poder de voto dos países integrantes. Como os Estados Unidos concentram 17% do total de votos, o que significa poder de veto, a reforma nunca prosperou. Por isso, para modificar o status quo do sistema financeiro internacional é necessário o consenso impulsionado através das diferentes organizações internacionais.
“Os abutres sequer devem ter um interesse econômico ao pretender um resultado exitoso em seus litígios. Poderiam ter-se assegurado contra um default; podem, inclusive, ganhar mais dinheiro com uma cessação de pagamentos do que sem ela. Evitar o default mediante a transferência de dinheiro da Argentina para alguns multimilionários criará mais desigualdade. Mas isto não é apenas uma questão de justiça. Os abutres impuseram enormes danos nos mercados globais de dívida soberana e naqueles países cujo bem-estar depende deles, especialmente nos mercados emergentes e nos países em desenvolvimento”, destacou o Nobel de Economia.
O “caso argentino” já repercutiu em nível internacional. Por exemplo, as praças financeiras da Inglaterra e Luxemburgo estabeleceram uma regulação para resguardarem-se perante os reclamos minoritários dos fundos abutres. O próprio chefe de Gabinete da Argentina, Jorge Capitanich, aventou que o país poderá recorrer à Organização das Nações Unidas para impulsionar uma convenção sobre a reestruturação de dívidas.
“Estas reestruturações são necessárias para que a economia de mercado funcione. Mas, infelizmente, enquanto os nossos (por Estados Unidos) têm um sistema para fazer frente à bancarrota privada, não temos nenhum sistema para as reestruturações de dívidas soberanas. Isto não é um jogo de soma zero; é um jogo de soma negativa, onde as perdas para o resto do mundo serão, em todo o caso, muito maiores, inclusive maiores do que os lucros acumulados pelos abutres”, concluiu Stiglitz.
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Uma nova arquitetura global - Instituto Humanitas Unisinos - IHU