A esquerda religiosa vai sentir falta de Steve Bannon

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29 Agosto 2017

A esquerda religiosa pode até estar feliz agora que Steve Bannon deixou a Casa Branca, mas talvez seja bom repensar. É verdade que ele foi o estrategista político que ajudou Trump a ganhar a Casa Branca atacando a imigração, as ações afirmativas e os gastos do governo nos pobres. E descreveu a agência de notícias que agora passou a gerenciar novamente, a Breitbart News, como uma mídia para a direita alternativa.

O comentário é de Thomas Reese, jornalista e jesuíta, publicado por Religion News Service, 28-08-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.

Mas o que a esquerda religiosa esquece é que eles concordam em algumas questões, e agora a voz de Bannon foi silenciada na Casa Branca. A expulsão pode ter sido uma vitória para que os Estados Unidos sejam mais inclusivos, mas na política interna do Partido Republicano também sinaliza o triunfo de orientações corporativas e intervencionistas do partido, que assustam a esquerda religiosa. E em outro sinal do fim da era Bannon, seu aliado, Sebastian Gorka, vice-assistente do presidente, foi forçado a sair, segundo notícias.

É irônico que a esquerda religiosa enxergue generais militares e um ex-executivo de grandes petrolíferas (o Secretário de Estado Rex Tillerson) como os adultos do governo Trump. Mas foi Bannon quem argumentou contra o envolvimento dos EUA no Afeganistão e no Oriente Médio. Nisso, ele estava em sintonia com ativistas da paz religiosa.

Foi ele quem disse que a globalização e os acordos comerciais prejudicam os trabalhadores estadunidenses. Foi ele quem mais criticou o establishment de Wall Street. Nisso, ele estava em sintonia com a esquerda religiosa, que sempre esteve muito próxima do movimento trabalhista estadunidense.

Em relação aos âmbitos comercial e corporativo dos Estados Unidos, Bannon dançou no mesmo ritmo que o senador Bernie Sanders (Democrata do estado de Vermont), o candidato preferido da esquerda religiosa.

Muito antes da campanha presidencial, Bannon expôs sua opinião em uma apresentação no Vaticano, no verão de 2014. A fala defendeu fortemente a ideia do capitalismo como criador de riqueza e da classe média. Mas, segundo ele, após a queda da União Soviética, o capitalismo perdeu sua base espiritual e moral nas crenças judaico-cristãs. Criticou o capitalismo clientelista patrocinado pelo Estado, praticado na China e na Rússia, bem como Ayn Rand ou a Escola Objetivista do capitalismo libertário.

Destacar o capitalismo libertário foi especialmente significativo, já que Ayn Rand é a santa padroeira dos republicanos, como o Presidente da Câmara, Paul Ryan (Republicano do estado de Wisconsin), que acredita que um mercado desregulado pode resolver todos os problemas. Por outro lado, ela é um dos principais alvos da esquerda religiosa, principalmente dos defensores do ensino social católico. Simboliza o capitalismo amoral e egoísta que eles odeiam.

Durante a discussão após a apresentação no Vaticano, Bannon criticou o Wall Street por analisar tudo "como uma oportunidade de securitização. As pessoas são consideradas commodities. Não acredito que nossos antepassados tivessem a mesma crença."

Para ele, a ganância dos bancos de investimentos foi responsável pelo crash financeiro de 2008. Acredita que as operações de resgate estavam erradas. Reclamou que "nenhuma acusação criminal foi levada a respeito de qualquer executivo do banco associado à crise de 2008". Pelo contrário, receberam bônus.

Soa como a linguagem da esquerda religiosa que abraçou o movimento de ocupação do Wall Street.

Bannon sempre se considerou líder de "um movimento populista de centro-direita da classe média, homens e mulheres trabalhadores do mundo todo que estão cansados de terem que seguir o que é ditado pela chamada festa de Davos", descrita por ele como a elite internacional que tenta "ditar a todos como o mundo vai ser governado".

O capitalismo clientelista é seu inimigo, pois "há regras diferentes para as pessoas que fazem as regras. É essa parceria de grandes governos e corporativistas." Pode-se ouvir o mesmo tipo de crítica dos bispos católicos em países em desenvolvimento onde a corrupção protege os ricos e, ao mesmo tempo, explora os pobres e destrói o meio ambiente.

Nos Estados Unidos, ele disse que a "maior luta é com o establishment republicano, que é uma série de capitalistas clientelistas que acham que podem seguir regras diferentes sobre como se comportar e como gerir as coisas. E, francamente, é por isso que a situação financeira dos Estados Unidos está tão terrível... " Essas palavras poderiam ter sido retiradas de um manifesto religioso de esquerda.

Bannon quer um capitalismo reorientado pelos valores cristãos. "Qual é o propósito de o que quer que seja que estou fazendo com essa riqueza?", perguntou. "Qual é o propósito do que estou fazendo com a capacidade que Deus nos deu, que a providência divina nos deu para realmente criar empregos e criar riqueza? Acho necessário que todos nós analisemos se realmente estamos reinvestindo em coisas positivas."

Mas, infelizmente, ele nunca responde a essas perguntas, porque o ódio ao governo não permite qualquer papel na regulamentação comercial. Para ele, as regulações governamentais levam ao capitalismo clientelista, enquanto para os defensores do ensino social católico elas devem proteger o bem comum do capitalismo desenfreado. E veem inclusive o papel do governo na redistribuição da riqueza.

A esquerda religiosa e Bannon também discordam da ideia de que ele só se preocupa com o impacto do livre comércio e da globalização em trabalhadores estadunidenses. A esquerda religiosa, por outro lado, também defende pessoas pobres estrangeiras que estão sendo exploradas por meio de baixos salários por corporações multinacionais. Também se preocupam com os pequenos agricultores que estão sendo retirados do mercado por produtos agrícolas baratos subsidiados pelo governo e advindos de agricultores dos Estados Unidos. Bannon é um nacionalista estadunidense que não reconhece o estrangeiro como o próximo na parábola do Bom Samaritano.

Então, quem ganhou com sua expulsão? De muitas maneiras, a esquerda religiosa pode estar feliz por ele ter saído, mas também deve se preocupar que com sua saída o establishment corporativo e os intervencionistas militares agora tenham pouca oposição na Casa Branca.

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