O paradoxo do populismo. Artigo de Nadia Urbinati

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28 Novembro 2017

“A luta populista é onívora e quer unir todas as pulsões de descontentamento sob uma palavra de ordem generalista e interclassista para conquistar uma maioria ampla que se pensa (e muitas vezes governa) como se fosse a verdadeira, porque corresponde ao povo ‘bom’. Não apenas um estilo, portanto, mas também um estilo que deve fazer vencer e que é legítimo enquanto faz vencer.”

A opinião é da cientista política italiana Nadia Urbinati, professora da Columbia University, em Nova York, e ex-professora da Unicamp, em artigo publicado por La Repubblica, 27-11-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

A acusação de populismo é uma prática generalizada e pouco custosa. “Populismo fácil” é o esporte da nossa preguiça mental. Requer pouco esforço analítico, pouca atenção aos detalhes e muita bobagem generalista. A arte da polarização simplificadora parece nos ajudar a nos posicionarmos politicamente, mas o seu simplismo é muito disfuncional. [...]

Essa inversão é a conclusão à qual a preguiça mental pode nos levar se usarmos o termo para demonizar os adversários, com o risco de não vermos o populismo quando e onde ele está.

O populismo é um fenômeno político que nasce e se alimenta nas democracias representativas; como esticamento das suas instituições, mas (quando consegue chegar ao poder) não necessariamente saída do sistema constitucional. Ele transfigura os dois pilares da democracia: o povo e o princípio de maioria. Ele é ambíguo e escapa às categorias ideológicas clássicas; é um estilo da comunicação política que, porém, não quer apenas fazer oposição, mas sim vencer o adversário, humilhando-o para torná-lo não influente.

A luta populista é onívora e quer unir todas as pulsões de descontentamento sob uma palavra de ordem generalista e interclassista para conquistar uma maioria ampla que se pensa (e muitas vezes governa) como se fosse a verdadeira, porque corresponde ao povo “bom”. Não apenas um estilo, portanto, mas também um estilo que deve fazer vencer e que é legítimo enquanto faz vencer.

O paradigma do discurso populista é o anti-establishment- ou seja, a oposição a todos aqueles que ocupam “poltronas”, que são “o palácio”. O mundo lá fora – “nós, pessoas” – não é corrupto, porque não tem responsabilidades políticas diretas; e, por isso, é o único tribunal legítimo.

Nestas décadas de dissolução das organizações partidárias (o único baluarte que a democracia tem contra o fenômeno populista), essa moeda foi abundantemente usada por todos aqueles que passaram pela cena política – à direita, assim como à esquerda. A acusação de partidocracia; a exaltação da sociedade civil como lugar de trabalho duro e empreendedorismo saudável contra os “políticos mantidos”; a vontade de “destruir” o velho para dar lugar ao novo; a intolerância com as “rédeas” institucionais, com os “laços e lacinhos” que freiam a vontade de fazer; a natureza insuportável daqueles que colocam bastões entre as rodas da vontade popular, que está apenas na maioria que ganha; a intolerância com os órgãos intermediários da política ou com os partidos “aparelhados” e a necessidade de líderes solitários e ágeis em destreza com o mundo da audiência e das pesquisas – tudo isso é aquilo que faz um agir político populista.

Desde o fim forçado do sistema dos partidos, desde 1992, toda a política italiana foi e é marcada pelo fenômeno populista. E as acusações saltam facilmente sobre quem as lança. O apelo ao povo, ao povo “bom” e “verdadeiro”, é o centro vital – não o povo como ficção jurídica da soberania, mas o social, identificado por oposição contra o não povo (o establishment) e que se une e se reconhece em palavras de ordem simples e em um líder que as personifica, recolhendo reivindicações e lamentos.

E, como o populismo é sinal de uma insuportabilidade em relação à divisão partidarizada e partidária do povo, a mensagem final é decisionista, de acordo com a ideia de que a política deve ser reduzida aos problemas concretos e objetivos das “pessoas”, estudáveis e abordáveis com a competência específica, não política e não partidarizada.

Portanto, cuidado para não rotular os adversários como populistas, porque, como no tênis, as bolas de rebote são insidiosas e marcam pontos.

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