Era secular, habitantes ou buscadores? Entrevista com Tomáš Halík

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06 Março 2015

A fé? É um caminho. A secularização? Um processo não necessariamente negativo. Temas que devem ser levados em consideração, vindo do padre Tomáš Halík, nascido em 1948, em Praga, onde hoje é pároco, professor de sociologia na Universidade de Praga, vencedor, dentre outros, do Prêmio Templeton 2014 pela sua obra de estudioso católico. Ele conheceu a clandestinidade – foi ordenado em 1978, em plena época comunista – e hoje traz a sua vasta experiência humana e de estudioso para dar sangue novo ao anúncio cristão.

A reportagem é publicada pelo jornal Avvenire, 04-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

"É preciso distinguir – diz – entre a secularização, que é um processo histórico, e o secularismo, que é uma verdadeira ideologia, cujo objetivo é apagar a voz dos crentes no espaço público. Assim como eu tento fazer nos meus livros, devemos sempre desenvolver a ideia de que a Igreja, no mundo contemporâneo, seja uma comunidade de pessoas a caminho. A secularização não é o fim da cristandade, mas representa a absorção de muitos elementos fundamentais da cristandade no contexto da sociedade moderna. É um processo que tem uma característica paradoxal, pois pode trazer uma espécie de 'perda de visibilidade'. É um paradoxo que revela, em um nível teológico, a característica da kénosis, do despojamento, típico do caminho cristão."

E é justamente um dos temas que estiveram no centro da reflexão do congresso organizado pela Universidade Gregoriana, no qual Halík falou nessa quinta-feira sobre "Discernir os sinais dos tempos".

Eis a entrevista.

Hoje, somos desafiados pelo multiculturalismo, presente na Europa, e também, ao mesmo tempo, pela presença de outras religiões. Como agir, na sua opinião?

Sim, é verdade, e às vezes temos a impressão de assistir a um confronto dramático. A Igreja tem um papel a desempenhar, como mediadora entre o mundo islâmico e a cultura secular do Ocidente, da qual ainda compartilha muitos valores.

O senhor acredita estar superada a distinção entre crentes e não crentes?

Penso que, como nos diz a sociologia das religiões, é mais exato distinguir entre "buscadores" e "habitantes". Porque, se virmos os números ou fizermos referência à nossa experiência, certamente parece estar em queda a prática religiosa e a frequentação de quem "habita" as Igrejas. E também é verdade que muitos "habitam", se sentem em casa, em uma visão que prescinde de Deus. Mas, ao mesmo tempo, cresce continuamente o número de pessoas que são "buscadoras". Cada vez mais pessoas concebem a fé como um caminho, um percurso dinâmico que atravessa períodos de crise e momentos de incerteza. Em tantas situações temos "crentes sem pertencimento". Como explicam os sociólogos, muitos dos nossos contemporâneos deixaram de se identificar com uma confissão específica, mas não deixaram de buscar o sentido da existência.

O que fazer?

É realmente uma grande questão. As pessoas em busca não podem ser fisgadas por aqueles que pensam possuir uma verdade definida e definitiva. É preciso um percurso de acompanhamento, o que implica atenção, diálogo, solidariedade, proximidade, respeito recíproco, generosidade. O Papa Bento XVI teve sobre isso a grande intuição do Átrio dos Gentios. O Papa Francisco demonstra o que pode fazer uma atitude franca, aberta, acolhedora.

De que modo a sua história pessoal está envolvida nessa atitude de diálogo?

Eu cresci na época comunista. Fui batizado aos 18 anos, depois estudei teologia clandestinamente, porque, na época, a Igreja agia nas catacumbas, sob a liderança da luminosa figura do cardeal Tomášek, arcebispo de Praga, uma das figuras-chave da resistência ao regime comunista. Também fui ordenado sacerdote na clandestinidade. E agora, como professor na universidade e, ao mesmo tempo, pároco, aproveito a minha experiência para buscar maneiras de falar aos homens e às mulheres, nossos contemporâneos.

Então, como compreender os sinais dos tempos?

A secularização não é o fim da era cristã, mas, como eu dizia, um processo de absorção da cristandade na cultura moderna. Um sucesso e um risco. No futuro, eu espero, a Igreja continuará atuando em uma situação de maior pluralismo cultural, ao qual deverá responder com um pluralismo interno cada vez maior. E emergirão modalidades de atuar e de viver a fé, talvez sob a insígnia de um paradoxo: ao mesmo tempo, ser "fiel" e "infiel", porque é um caminho, que nunca termina, com momentos de incerteza. A tarefa da Igreja, além da pastoral e da atividade missionária, poderá ser a de acompanhar esses buscadores, trabalhar junto com eles, a caminho com eles. Um acompanhamento e um diálogo que trarão um paradigma novo para a eclesiologia, na linha da nova evangelização empreendida por João Paulo II.

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