A pulseira de Bergoglio. "Refugiados são lutadores da esperança"

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03 Outubro 2017

O pulso do Papa com a pulseira amarela com a qual se numeram os refugiados – a sua é 390003 - não só fornece uma imagem poderosa da visita de Francisco a Bolonha. É um gesto profético: em seguida reconfirmado diante do corpo da Universidade com uma citação, aparentemente inofensiva.

Naquele oferecimento do pulso de Francisco existe a profecia do Evangelho de João ("Quando eras mais moço, te cingias a ti mesmo"). Está presente a denúncia suave e extremamente dura da tentativa de reduzir a sua instância evangélica a expressão de 'um determinado catolicismo', a ser desqualificada por ser ingênua ou potencialmente 'herética' (como afirma o tradicionalismo bem pequeno e muito barulhento que se esforça para parecer metade da Igreja).

O comentário é de Alberto Melloni, historiador, publicado por República, 02-10-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

Tanto é verdade que a força profética encerrada naquele 390003 não se exauriu no hub dos refugiados. Mas reverberou no discurso diante da Universidade de Bolonha, onde Francisco dirigiu-se ao ateneu mais antigo do mundo. Um discurso longe daqueles ocasionais nas últimas décadas e que lembra por importância aquele de Regensburg. Em setembro de 2006, a palestra inaugural ministrada pelo papa Ratzinger na última universidade onde havia ensinado, tornou-se um casus belli devido a uma citação bizantina contra o Islã. O apreço professoral pelas citações de efeito (dizem que o cardeal Sodano o tivesse advertido) transformou-se em uma palavra de ordem para aquele mundo xenófobo e relativista em matéria de democracia, a despeito das intenções do Papa. E ainda hoje as minorias do tradicionalismo o citam como um exemplo de como um "verdadeiro" Papa deveria tratar os muçulmanos.

Em Bolonha, Francisco fez um discurso não menos denso, teologicamente e politicamente exigente: carregado pelo sonho europeu e de uma visão do mundo que relega a palestra inaugural de Regensburg à categoria de anterior. Fez isso em uma universidade que de certa forma é ‘dele’, não só porque, como lhe recordou o reitor Ubertini, tem uma sede em Buenos Aires, mas porque na história do papado, as bulas do pontífice entravam em vigor quando eram ensinadas em Bolonha, não quando eram assinadas em Roma.

E para Bolonha Francisco levou uma contribuição para a concepção do direito pós-moderno identificando três direitos - o direito à cultura, o direito à esperança, o direito à paz - que entregou aos alunos e seus mestres.

O direito à cultura, como cultivo de um senso crítico oposto às "pantomimas da indignação". O direito à esperança, como contraste às "frases feitas dos populismos" e a "inquitante e rentável difusão de notícias falsas". E, finalmente, o direito à paz.

Ele fez isso recorrendo ao magistério de Bento XV - o Papa que condenou a guerra como "massacre inútil". E fez isso, declarando que a Igreja não é "neutra, mas mobilizada pela paz", com uma frase de Giacomo Lercaro: "A Igreja não pode ficar neutra diante do mal, de onde quer que ele venha: a sua vida não é a neutralidade, mas a profecia". Lercaro proferiu essa frase em 1º. de janeiro de 1968, primeiro Dia Mundial da Paz, parafraseando um texto de Giuseppe Dossetti.

Divulgado em plena guerra do Vietnã, enquanto se perseguia a quimera de promover um cessar-fogo com a neutralidade frente aos bombardeios arrasadores, aquela profecia custou ao idoso cardeal a remoção do cargo, no ápice de um complexo complô, dotado de mandantes e executores. Bergoglio o usou sem ênfase e sem reduções, porque a profecia é o seu registro.

Recebendo o Papa, tanto o arcebispo Zuppi como o reitor Ubertini recordaram o outro Francisco, que chegou a Bolonha no ano de 1222: ele pregava modus concionandi e se fazia entender por todos. O outro Francisco, que chegou ontem em Bolonha, usou o mesmo modus. E se fez entender.

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