Impeachment sem legitimação

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27 Setembro 2016

“No caso do impeachment da presidenta, o "procedimento" foi amplamente contestado, no Brasil e no exterior, por ser considerado um mero ritual imposto por maioria política eventual. Faltou "apoio generalizado" em vários momentos do processo, com acusações de que se teriam violado os direitos da acusada, sobretudo porque vários julgadores votaram pela condenação, mas admitiram explicitamente não haver crime de responsabilidade. Os protestos políticos se seguiram também à decisão, questionando o respeito a regras formais e materiais do procedimento”, escreve Pablo Holmes, doutor em sociologia pela Universidade de Flensburg (Alemanha), professor de teoria política na Universidade de Brasília, em artigo publicado por Folha de S. Paulo, 26-09-2016.

Eis o artigo.

Em artigo publicado nesta Folha, o professor João Maurício Adeodato procura justificar juridicamente o processo de impeachment de Dilma Rousseff.

O autor parece se inspirar na teoria dos sistemas do sociólogo alemão Niklas Luhmann, mas nesse intento comete equívocos teóricos graves.

Primeiramente, o autor não observa que a legitimação procedimental, no Estado democrático, depende de um "apoio generalizado" ao procedimento.

Para haver isso, também os derrotados têm que aceitar e reconhecer o processo como legítimo, embora insatisfeitos com o conteúdo final da decisão. Se este é amplamente contestado, pode ocorrer carência de legitimação e, em casos limite, até mesmo desobediência civil.

Outro grave equívoco consiste na simplificação do conceito de legitimação como resultado de puro formalismo, mesclando-o estranhamente com uma situação em que autoridades podem decidir quase como queiram.

Em democracias não há valores morais absolutos, todavia as regras materiais do jogo político precisam ser respeitadas, caso não se queira produzir igualmente conflitos generalizados, ilegitimidade crônica ou transitar para formas ditatoriais.
Imaginemos, por exemplo, que um líder carismático fizesse aprovar pelo Congresso emenda constitucional que abolisse a propriedade privada ou o direito de voto de afrodescendentes.

"Autoridade competente" e "rito de elaboração" não seriam capazes de "legitimar" tal emenda, pois ela violaria várias cláusulas pétreas. Se o Judiciário viesse a chancelá-la, seria difícil não admitir violados os direitos fundamentais e a segurança jurídica.
Nesse novo regime, os donos do poder poderiam impor sua vontade de modo autoritário, servindo-se do direito como bem entendessem. Não se poderia mais falar em "legitimação pelo procedimento", muito menos em "democracia", apenas em ditadura com apoio popular.

No caso do impeachment da presidenta, o "procedimento" foi amplamente contestado, no Brasil e no exterior, por ser considerado um mero ritual imposto por maioria política eventual. Faltou "apoio generalizado" em vários momentos do processo, com acusações de que se teriam violado os direitos da acusada, sobretudo porque vários julgadores votaram pela condenação, mas admitiram explicitamente não haver crime de responsabilidade.

Os protestos políticos se seguiram também à decisão, questionando o respeito a regras formais e materiais do procedimento.
Enfim, na sua tentativa de mesclar "formalismo" jurídico com "decisionismo" político, Adeodato propõe uma legitimação procedimental "sui generis".

Por trás dela, encontra-se não o modelo democrático, mas o "decisionismo" do filósofo e jurista alemão Carl Schmitt.
Na década de 1930, afirmava que a legitimidade de qualquer decisão de Hitler advinha do fato de ele ser detentor do poder.
"Dominantes e decisivas não são as visões e concepções em termos gerais, mas as visões de seres humanos de determinado tipo. No Estado alemão do presente, o movimento nacional-socialista tem a liderança. Portanto, a partir dos princípios deste, deve ser determinado o que são bons costumes, boa-fé, exigências razoáveis, segurança e ordem pública etc."

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