20 Novembro 2019
A mensagem retumbante do Papa Francisco, na sexta-feira passada, aos penalistas reunidos no Vaticano, foi recebida por um silêncio igualmente retumbante e escandaloso por parte de quase toda a imprensa italiana. O não à prisão, as críticas à prisão perpétua para abrir uma janela de esperança para quem está preso e a condenação à prisão preventiva não foram consideradas dignas de primeira página, mas apenas de um artigo interno, quase oculto, de maneira que quase ninguém pudesse vê-lo. Contudo, naquelas palavras, o Papa ataca a parte mais poderosa da magistratura italiana, que está coletando assinaturas em favor da prisão perpétua. É ou não é uma notícia que o Papa esteja mirando o poder judiciário? Claro que é, e uma grande notícia que mereceria as manchetes. Não para o nosso sistema de informação que, cabe pensar, talvez tenha medo de ferir a sensibilidade dos magistrados que são tão poderosos e que frequentemente vazam informações confidenciais e sob segredo a alguns jornalistas ... a alguns jornalistas, para dizer a verdade, não a todos. Mas essa leitura é provavelmente muito malvada e não capta o verdadeiro motivo.
A reportagem é de Angela Azzaro, publicada por Il Reformista, 19-11-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Muito provavelmente, a imprensa italiana ficou em silêncio sobre a notícia do ataque do Papa à magistratura porque compartilha a ideologia que os promotores representam e que o papa Francisco definiu tão bem de "idealismo penal". O que é o idealismo penal? Para Francisco, é a convicção (negativa, muito negativa) de que tudo, mas realmente tudo, até a luta política, possa ser resolvido através das algemas, da prisão, da caça a qualquer infrator. É aquela ideologia que na Itália fez com que o Artigo 27 da Constituição fosse desprezado e que as penas, em vez de ter um objetivo reeducativo, se tornassem vingança, berlinda, linchamento: um objetivo de pena nunca antecipado e sempre prolongado pelo circo midiático judiciário.
Talvez seja por isso que a notícia tenha acabado nas últimas páginas, escondida. Porque o processo midiático de que somos vítimas hoje nasce graças àquele curto-circuito criado entre jornais, TV e uma parte da magistratura. A notícia não foi subestimada, foi entendida muito bem e se quis fingir que nada havia acontecido. Muitas vezes acontece que, na primeira página, se encontrem notícias que teriam pouca importância e que outras, muito mais importantes, terminem em uma pequena nota. Se uma pessoa recebe uma intimação, o artigo aparece na primeira página, às vezes antes mesmo que a pessoa em questão o saiba. A presunção de inocência não é levada em consideração, mas a presunção de culpa sim e o suspeito acaba no olho do furacão. Se a mesma pessoa for absolvida, a notícia é colocada lá no meio do jornal, ainda mais escondida do que as palavras de Francisco. E, no entanto, é a primeira vez que um grande intelectual, que também é o guia de uma das três religiões monoteístas, reúne a crítica às desigualdades com a crítica ao justicialismo. Ultimamente, Francisco não é ouvido em muitas questões, por exemplo, sobre os migrantes, sobre os pobres que não têm cor nem nação.
Mas desta vez o silêncio de suas palavras é ainda mais forte, mais chocante. O justicialismo, explicou o pontífice, é a linfa da linguagem do ódio, é aquele mecanismo que transforma os fenômenos políticos e as relações sociais em barbárie. Francisco iniciou a sua cruzada contra essa cultura e fez isso de uma maneira muito clara, com uma força rara e com um raciocínio excepcional. O circo midiático o ignorou por medo, subordinação, conivência, para seguir seu próprio caminho. Mas aquelas palavras permanecem e não podemos desconsiderá-las. É inútil gritar ao lobo contra a linguagem do ódio se não se tenta acolher e assumir o discurso de Bergoglio. O idealismo criminal alimenta o ressentimento, empobrece a ideia da política, faz com que a informação claudique e esteja a serviço de um poder. Um tema enorme, um tema epocal. Mas para a maioria dos meios de informação, foi melhor ignorá-lo.
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Papa Francisco, a imprensa censura o seu “não” ao punitivistas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU