24 Mai 2019
"Embora com intuito de proteger, existem leis cujos usos contrariam objetivos, como a Lei da Alienação Parental, que tem inibido a comunicação de violações de direitos e, em muitos casos, quando realizadas, têm resultado em que as mães que comunicam inclusive violências sexuais contra filhos e filhas tenham que assistir a justiça dando a guarda para pais e padrastos violadores", escreve José Carlos Sturza de Moraes, cientista Social, mestre em Educação e ex-Conselheiro do Conanda.
Eis o artigo.
A legislação nacional de proteção às crianças e adolescentes e seu direito ao cuidado tem avançado no Brasil. Como exemplos podemos disso, temos a Lei Menino Bernardo e a que recentemente estabeleceu o aumento da idade mínima para que adolescentes possam viajar desacompanhados. Ambas alteraram o texto do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Entretanto, embora com intuito de proteger, existem leis cujos usos contrariam objetivos, como a Lei da Alienação Parental, que tem inibido a comunicação de violações de direitos e, em muitos casos, quando realizadas, têm resultado em que as mães que comunicam inclusive violências sexuais contra filhos e filhas tenham que assistir a justiça dando a guarda para pais e padrastos violadores. Ou seja, em nome da lei, se pune a comunicação de violência, enquadrando-a como alienação parental. E, ainda que existam casos de comunicação inverídica, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) expediu Nota Técnica, em 2010, propondo a revogação de diversas partes da lei, aprovada naquele mesmo ano, pois já existiam outras formas de salvaguardar as pessoas eventualmente acusadas de forma inverídica.
De forma menos evidente, a reforma do Código Civil que estabeleceu a Guarda Compartilhada vem sendo usada como instrumento de perpetuação de relações de violência contra a mulher-mãe, ainda que não mais casada ou convivente com o ex-companheiro, uma vez que é norma automática, tendo que a pessoa, pai ou mãe, que discorda de sua decretação ter que manifestar-se. E se sabe que muitas mulheres, devido a violências físicas e psíquicas sofridas, assim como ameaças à integridade de seus filhos e filhas e de outras pessoas da família, não têm segurança em acusar o agressor.
Tais situações se agravam também pela inexistência na maioria das Comarcas de equipes interprofissionais e pela a precariedade dos serviços utilizados suprir tal falta, violando direitos e expondo crianças, adolescentes e mulheres a processos de mortificação em vida, de morte civil.
Nesse cenário, é imprescindível que Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, de Mulheres e de Direitos Humanos, assim como sindicatos e conselhos de categorias profissionais coloquem na ordem do dia essas questões e ajam efetivamente para sua reversão. Assim como também se produzam espaços de escuta e cuidado horizontal entre as pessoas que sofrem essas violações para que tenham forças para seguir vivendo e, no seu tempo, romper com tais situações que vitimam silenciosa e invisivelmente mulheres, crianças e adolescentes.
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Violências em nome da lei - Instituto Humanitas Unisinos - IHU