Comunicação, santidade e os excessos da mídia (inclusive católica)

Mais Lidos

  • “A destruição das florestas não se deve apenas ao que comemos, mas também ao que vestimos”. Entrevista com Rubens Carvalho

    LER MAIS
  • Povos Indígenas em debate no IHU. Do extermínio à resistência!

    LER MAIS
  • “Quanto sangue palestino deve fluir para lavar a sua culpa pelo Holocausto?”, questiona Varoufakis

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

10 Abril 2018

Na Exortação Apostólica "Gaudete et exsultate” do Papa Francisco são encontradas indicações também para quem comunica, e podem ser um útil antídoto contra a hipertrofia do "eu”, o egocentrismo, a violência verbal, a zombaria, a incapacidade de sentir empatia pelas razões dos outros e pela dor dos outros; a incapacidade de fazer uma autocrítica.

A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada por Vatican Insider, 09-04-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.

Comentando a seguinte frase das bem-aventuranças anunciadas por Jesus: "Felizes os mansos, porque possuirão a terra", Francisco escreve: " É uma frase forte, neste mundo que, desde o início, é um lugar de inimizade, onde se litiga por todo o lado, onde há ódio em toda a parte, onde constantemente classificamos os outros pelas suas ideias, os seus costumes e até a sua forma de falar ou vestir. Em suma, é o reino do orgulho e da vaidade, onde cada um se julga no direito de elevar-se acima dos outro"(71).

A indicação é a de ser mansos: "No entanto, apesar de parecer impossível, Jesus oferece outro estilo: a mansidão". Quando vivemos "agitados e arrogantes diante dos outros, acabamos cansados e esgotados. Mas quando vemos suas limitações e defeitos com ternura e mansidão, sem nos sentirmos superiores, podemos dar-lhes uma mão e evitar o desperdício de energia em lástimas inúteis", sugere o Papa Bergoglio.

Outra bem-aventurança diz respeito à capacidade de compartilhar o sofrimento e a dor. "A pessoa que, vendo as coisas como realmente estão, se deixa trespassar pela aflição e chora no seu coração, é capaz de alcançar as profundezas da vida e ser autenticamente feliz" (76). O Papa nos lembra que a vida "tem sentido quando ajudamos o outro em sua dor, quando compreendemos o sofrimento das outras pessoas, quando damos alívio para os outros. Essa pessoa sente que o outro é carne de sua carne, não tem medo de chegar perto e tocar a ferida, sente compaixão até experienciar que as distâncias se anulam". Mais uma vez, estas são palavras que não deveriam deixar indiferente quem se ocupa das comunicações.

Em outro capítulo da exortação, descrevendo algumas características essenciais da vida santa como "suportar-se mutuamente, paciência e mansidão," Francisco escreve: "É preciso lutar e estar atentos às nossas inclinações agressivas e egocêntricas, para não deixar que ganhem raízes" (114). O egocentrismo, a tendência a se mostrar, a acreditar-se melhor, a destacar-se, a colocar-se em um pedestal é característica muitas vezes vista no mundo midiático, e na mais ampla galáxia da web.

Francisco não concede descontos e escreve que "também os cristãos fazem parte de redes de violência verbal através da internet e vários fóruns ou espaços de intercâmbio digital. Mesmo nas mídias católicas, é possível ultrapassar os limites, tolerando-se a difamação e a calúnia e parecendo excluir qualquer ética e respeito pela reputação alheia. Gera-se, assim, um dualismo perigoso, porque, nessas redes, dizem-se coisas que não seriam toleráveis na vida pública e procura-se compensar as próprias insatisfações descarregando furiosamente os desejos de vingança. É impressionante como, às vezes, pretendendo defender outros mandamentos, se ignora completamente o oitavo: «não levantar falsos testemunhos» e destrói-se sem piedade a imagem alheia" (115).

Não há necessidade de ser especialista na área para perceber quanta violência verbal, zombaria, difamação e calúnia existe na galáxia da web, mesmo em sites, blogs e mídias sociais que veem católicos como protagonistas. O abuso das fontes anônimas para transmitir as opiniões mais desdenhosas, os ataques diários a outros cristãos "réus” por não pensar da mesma maneira.

O Papa recordou que "o santo não gasta as suas energias a lamentar-se dos erros alheios, é capaz de guardar silêncio sobre os defeitos dos seus irmãos e evita a violência verbal que destrói e maltrata, porque não se julga digno de ser duro com os outros, mas considera-os superiores a si próprio" (116). Ele acrescenta que "não nos faz bem olhar com altivez, assumir o papel de juízes sem piedade, considerar os outros como indignos e pretender continuamente dar lições. Esta é uma forma sutil de violência" (117).

São sugestões que se adicionam àquelas, muito claras e conhecidas há séculos, que o patrono dos jornalistas, o bispo São Francisco de Sales, havia definido no início do século XVII em sua “Filoteia”. O santo escrevia: "ao julgar o próximo, se deve prestar tanta atenção, como um hábil cirurgião que corta entre os nervos e os tendões. É preciso que o golpe que eu der seja tão certeiro e justo, que não diga nem mais nem menos do que é". Ele acrescentou: "seja sincera tua linguagem, agradável, natural e fiel. Guarda-te de dobres, artifícios e toda sorte de dissimulações, porque, embora não seja prudente dizer sempre a verdade, entretanto é sempre ilícito faltar a verdade".

Francisco de Sales sugeria um critério particularmente indicativo: "eis aí como devemos julgar do próximo: o melhor possível; e, se uma ação tivesse cem aspectos diferentes, deveríamos encará-la unicamente pelo lado mais belo sempre interpretando a favor de outros".

E concluía: "O homem justo, quando não pode escusar um fato nem a intenção daquele que, aliás, conhece por homem de bem, não só não o quer julgar, mas lança de si tal pensamento e deixa o juízo unicamente a Deus [...] Assim se as vezes não podemos desculpar o pecado do próximo, tornemo-lo ao menos digno de compaixão, atribuindo a falta a causa mais sofrível que possa ter, como a ignorância ou a fraqueza".

Nota de IHU On-Line: A íntegra do documento, em português, pode ser lida aqui.

Leia mais

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Comunicação, santidade e os excessos da mídia (inclusive católica) - Instituto Humanitas Unisinos - IHU