01 Novembro 2019
Publicamos aqui o comentário do Irmão Lino, da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste domingo, Solenidade de Todos os Santos, 3 de novembro (Mateus 5,1-12a). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A Solenidade de Todos os Santos deste ano é iluminada pela canonização, por parte do Patriarcado de Constantinopla, de quatro santos, quatro monges do Monte Athos. Podemos dizer que um deles, em particular, nós o conhecemos, com os irmãos com quem o visitamos há 25 anos, graças a um encontro inesquecível, depois de horas de ascensão ao longo de uma trilha de mulas que escalava do mar até a sua cela. Ele se chamava Efrém, ou, melhor, Papa Efrém, e, ainda em vida, irradiava uma luz difusa sobre o mundo cristão.
Raramente eu conheci um homem daquela beleza: com mais de 80 anos, os cabelos totalmente brancos, muito longos, o olhar fulgurante e, no fundo daquele olhar, os seus olhos, como dois rubis, duas brasas ardentes. Ele vivia em um eremitério no chamado “deserto vertical” da santa montanha, mas estava em contato com o universo inteiro. Ele nos disse: “A terra está repleta de santos, mas não sabemos vê-los!”.
Essas palavras nos remetem poderosamente ao evangelho de hoje, o evangelho das Bem-aventuranças, que inicia com estas palavras: “Vendo Jesus as multidões (...) começou a ensinar aos seus discípulos”.
O que ele ensinava? Ensinava acima de tudo a ver, a ver aquilo que ele via naquelas multidões, a ver com os olhos do coração, olhos lavados pelas lágrimas, olhos aguçados pelo doloroso amor recebido e dado. Ver naquelas multidões os pobres de espírito, aqueles que estão em prantos, os mansos, aqueles que têm fome e sede de justiça... já presentes e operantes, aqui e agora.
As Bem-aventuranças não são uma lei nova, uma exortação moral, o presságio de algo que deve vir, uma ascese a ser percorrida para nos tornarmos mansos, puros... as Bem-aventuranças são um apocalipse, uma revelação dessas pessoas vivas já agora, nesta vida, e não em outra, que Jesus nos ensina a discernir nas multidões de todos os dias. Tudo aquilo que é grande é simples. Não é preciso inventar uma santidade como um esforço heroico, mas sim vê-la onde ela já está e não a percebemos, por estarmos distraídos, por não sermos humanos o suficiente.
Não é essa realmente a experiência de cada um de nós? Quantas pessoas encontramos que nos abençoaram com a sua mansidão, nos batizaram com as suas lágrimas, nos curvaram com a pureza do seu coração, e nada mais teria sido como antes se, mesmo que por apenas um instante, tivéssemos captado a sua leve presença?
Sentimos-nos perdidos e desorientados, pequenos demais, e então corremos para buscar a santidade em improváveis manifestações extraordinárias e não percebemos que, em vez disso, ela está presente na cotidianidade de uma pessoa fiel que está ao nosso lado.
Lembro-me de algumas palavras de Bruce Wayne, herói que tinha o maior poder, o de ser humano: “ Qualquer um pode ser um herói – um santo –, até mesmo um homem que faz uma coisa simples e reconfortante como colocar um casaco sobre os ombros de um criança, para fazê-la entender que o mundo não acabou”.
São palavras de alguém que aprendeu a ver e também podem se tornar, nesta solenidade, as nossas palavras.
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