Igreja e discriminação/exclusão dos casados

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13 Julho 2018

"O Papa Francisco pode suscitar expectativas de mudança. Contudo, o fenômeno da reprodução social opera no interior de qualquer instituição; as pessoas detentoras de poder na Igreja, celibatárias, gestadas na ideologia vigente, tendem a reproduzi-la. Aos cristãos, contudo, anima a esperança: novos tempos virão – precisamos gestá-los", escreve Jorge La Rosa, doutor em Psicologia Social e professor universitário – UFRGS.

Eis o artigo.

A opção pelo celibato é escolha respeitável que tem sido feita através da história por indivíduos de todas as culturas e religiões, por razões variadas. No Cristianismo nascente o celibato era opção possível, mas não a regra; número significativo de apóstolos era casado, proveniente do Judaísmo que valorizava a família. Os Pais do povo judaico e os grandes profetas da Aliança eram casados, assim como os sacerdotes.

O próprio Cristo escolheu homem casado para chefiar a Igreja, Pedro, quando tinha opção de escolher celibatário. São Paulo dá sábio conselho a respeito do perfil do bispo, consignado na Bíblia (1Timóteo 3, 1-5):

“É preciso que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma única mulher, sóbrio, cheio de bom senso... Que ele saiba governar bem a própria casa, mantendo seus filhos na submissão, com toda a dignidade. Pois se alguém não sabe governar bem a própria casa, como cuidará da Igreja de Deus? ” - O comum era o bispo ser casado, bispo celibatário era exceção.

A Igreja Cristã nos seus primórdios seguiu essa orientação. Havia liberdade para casar-se ou permanecer celibatário. A Igreja se expandiu.

Mas, a partir do século IV, e nos seguintes, a história progressivamente foi mudando. As leis eclesiásticas foram excluindo os casados do episcopado e, no rito latino, também do sacerdócio. Iniciava-se um período de negação da tradição apostólica e exclusão da liberdade, tão cara a São Paulo, e de discriminação e exclusão dos casados dos ministérios ordenados (exceção ao diaconato, cuja inclusão só se deu no século XX, com Paulo VI, após muitos séculos...) que perduram até hoje. A Igreja pretende anunciar e praticar os ensinamentos de Jesus que decorrem de suas palavras e práticas, mas não o é na questão do ministério sacerdotal: ignora e contraria a prática do Mestre. Milhares de pessoas recebem a graça da vocação ao matrimônio e ao sacerdócio (encontrei diversas), que a Igreja impede de vicejar; a Igreja é contra o aborto de seres humanos, mas em relação à graça...Ao não contar com esses milhares de pastores que estariam a serviço do Evangelho os católicos são abandonados e espoliados, mas isso é menos importante que as leis originadas da burocracia jurídico-eclesiástica. São Paulo, no seu tempo, viveu esse dilema ao se deparar com aqueles que enfatizavam a observância da lei para alcançar a salvação, enquanto insistia que ela é antes de tudo graça. A história se repete. Há leis canônicas antievangélicas e contrárias à tradição apostólica. A exclusão dos casados do episcopado e do sacerdócio é um exemplo; a Igreja no discurso é contra toda e qualquer discriminação, mas na prática discrimina os casados e os julga indignos dos ministérios ordenados.

A Igreja tem encolhido no Brasil. As causas são várias, mas quando uma instituição se opõe e contraria o próprio Fundador, pode-se entender as vicissitudes pelas quais passa e o encolhimento observado. Em 1940, 95,2% dos brasileiros eram católicos, em 2010 somavam 64,6%, com perda de mais de 30%. Em 2016, segundo pesquisa do DataFolha representavam 50%. Em 20 anos, a perdurar as circunstâncias, quantos serão?

Implantou-se na Igreja a celibatocracia, ou seja, o poder sagrado somente aos celibatários, o que originou uma direção viesada da Instituição.

O Papa Francisco pode suscitar expectativas de mudança. Contudo, o fenômeno da reprodução social opera no interior de qualquer instituição; as pessoas detentoras de poder na Igreja, celibatárias, gestadas na ideologia vigente, tendem a reproduzi-la. Aos cristãos, contudo, anima a esperança: novos tempos virão – precisamos gestá-los.

Não demorará muito e a Igreja pedirá perdão ao Povo de Deus por ter-lhe privado por quase dois milênios do ministério sacerdotal dos casados, às pessoas com essa vocação por ter-lhes impedido de exercer o ministério, e, não menos importante, a Deus por ter ignorado e contrariado a prática de Jesus por uma legislação antievangélica.

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