Um padre jesuíta que evangeliza na internet, na TV e no altar

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17 Novembro 2012

Em meados de setembro, duas das mais altas personalidades do catolicismo hoje – o cardeal Timothy Dolan, de Nova York, e o comediante/falso comentarista político Stephen Colbert – reuniram-se para uma discussão íntima sobre fé e humor com os estudantes da Fordham University, no Bronx, Nova York. Segundo todos, o fórum na Fordham foi um sucesso. O New York Times o considerou como o "evento de evangelização católica de jovens mais bem sucedido desde que o Papa João Paulo II apareceu pela última vez na Jornada Mundial da Juventude", em que a Igreja se encontrou com os jovens católicos onde eles são – tuitando, rindo e, é claro, assistindo ao Colbert.

A reportagem é de Brian Roewe, publicada no jornal National Catholic Reporter, 03-11-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Na verdade, esses são os mesmos lugares em que você pode encontrar o padre jesuíta James Martin, que também estava no meio do palco da Fordham – literalmente sentado entre o cardeal e Colbert, moderando a conversa, mas também desempenhando um papel-chave para ajudar dois professores da Fordham a montar tudo.

Ao chamar aquela noite de a essência da nova evangelização, Dolan descreveu o tipo de ministério que Martin pratica todos os dias – online, na TV e no altar.

Encontrando Deus em todos os lugares

Sendo um autor de nove livros já, o projeto mais recente de Martin é explorar a vida de Cristo através do estudo textual, da espiritualidade e da sua peregrinação de 2011 para a Terra Santa.

"Eu gostaria de passar 24 horas por dia trabalhando nisso se eu pudesse", disse Martin, 51 anos, recentemente ao NCR.

Infelizmente, os seus dias não oferecem tal luxo. Simplificando, Martin está ocupado difundindo a fé – em toda a parte.

Editor contribuinte da revista America, Martin bloga e escreve para a revista, interagindo enquanto isso diariamente com os seus muitos seguidores no Facebook e no Twitter. Em abril, a sua hashtag #WhatSistersMeanToMe – uma forma para que as pessoas mostrassem apoio às religiosas norte-americanas sob investigação do Vaticano – chamou a atenção entre os meios de comunicação nacionais que frequentemente se voltam para ele como fonte ou como comentarista.

Suas aparições na mídia têm variado de The O'Reilly Factor, a MSNBC e a BBC, passando pelo History Channel, PBS, Rádio do Vaticano e The Colbert Report do Comedy Central, onde ele atua como capelão oficial do programa.

"É uma ótima maneira de evangelizar", disse Martin. "Eu chego a mais pessoas nesses cinco a 10 minutos em que eu estou nesse programa do que em um ano de homilias".

O amável perfil midiático de Martin foi parcialmente desenvolvido com a ajuda do ex-editor da America, o padre jesuíta Tom Reese, que disse: "É raro encontrar alguém que tenha um histórico nos negócios, que seja artisticamente sensível, que esteja preocupado com a justiça social, com a espiritualidade, com os filmes e com a Broadway... Ou seja, ele é como o homem da Renascença".

Mas, para Martin, os holofotes da mídia não estão sobre ele, mas sim sobre o seu ministério. Ele diz frequentemente que Jesus usou o meio das parábolas, e por isso devemos usar todas as ferramentas disponíveis na evangelização de hoje.

Essa perspectiva levou-o a mergulhar em uma paisagem diversificada: textos, blogs e vlogs sobre as suas experiências com os trabalhadores do Ground Zero; suas piadas favoritas na série online Forty Days of Funny, para promover o lançamento do seu livro Between Heaven and Mirth: Why Joy, Humor, and Laughter Are at the Heart of the Spiritual Life; e até mesmo atrevendo-se a comparar e contrastar Jesus com a atriz Lindsay Lohan.

"Eu acho que Deus ficaria bastante desapontado conosco se não usássemos todos os meios da cultura pop para tentar espalhar a boa nova", disse Martin.

Uma voz "única e divertida"

Embora ele certamente não seja o único padre que tuíta ou que fala da fé através da linguagem da cultura pop, Martin sem dúvida é o mais visível e possivelmente o mais qualificado.

"Eu achei que ele poderia fazer toda a parte midiática muito bem. Eu nunca sonhei que ele iria se tornar tão proeminente, articulado e bom nisso", disse Reese.

Parte disso se deve à voz de Martin – engraçada e perspicaz, mas acima de tudo atraente.

"Há uma espécie de humildade e de autodepreciação nele que é muito refrescante. Eu não acho que Jim se leve muito a sério", disse a Ir. Janice Farnham, amiga e ex-professora de Martin na Weston Jesuit School of Theology (agora parte do Boston College), em Cambridge, Massachusetts.

"Ele é feliz como padre, alguém que usa o seu colarinho romano não como um sinal de autoridade, mas sim de serviço", disse Farnham, religiosa de Jesus e Maria, de Arlington, Massachusetts.

Apresentar a complexa teologia católica de uma forma digerível, mas não aguada, é muitas vezes um obstáculo para os autores católicos, disse o padre jesuíta Walter Modrys, mas isso "não é verdade com relação a Jim", com quem ele trabalhou enquanto era pároco da Igreja Santo Inácio de Loyola, em Manhattan, Nova York.

"O seu talento é que ele pode tomar um conceito difícil, digamos, da espiritualidade inaciana ou situações problemáticas na Igreja e falar sobre eles de uma forma que é muito acessível para as pessoas que não têm um pano de fundo teológico particular", disse.

A acessibilidade define os livros de Martin The Jesuit Guide to (Almost) Everything: A Spirituality for Real Life sozinho vendeu mais de 150 mil de cópias; Between Heaven and Mirth bem mais de 70 mil.

"Ele tem uma voz única, divertida, uma forma de apelar não apenas aos católicos, mas a públicos mais amplos", disse Mark Tauber, vice-presidente sênior e editor da HarperOne, publicou ambos os livros.

Ler um capítulo em um dos livros de Martin equivale a ler um capítulo da sua vida. Tal é o caso do seu projeto mais recente – antes de fazer a sua peregrinação à Terra Santa, Martin hesitou, temendo que havia se tornado um destino turístico. Mas ver o mar da Galileia inalterado desde o tempo de Jesus foi surpreendente.

"Eu poderia ter morrido na Galileia e ter sido feliz, e poderia dizer: 'Eu vi tudo o que eu sempre quis ver'", disse ele ao NCR.

Mediante contos pessoais como esses e muitas vezes com um sorriso, a voz escrita de Martin se torna a voz de um amigo do leitor, que não fala com autoridade, mas caminha ao lado por meio da teologia e da espiritualidade.

"Eu sempre penso em mim mesmo aos 26 anos", disse Martin. "Eu não sabia quem era Santo Inácio de Loyola. Eu literalmente não sabia – e digo literalmente – o que era um jesuíta".

Aos 26 anos, Martin não era jesuíta, mas sim um iniciante executivo financeiro da General Electric, em grande parte em Nova York, e um graduado em negócios pela Wharton School, na Filadélfia.

Infeliz na busca por mais dinheiro, Martin encontrou o seu chamado vocacional em grande parte da mesma forma forma que as pessoas o encontram hoje – através da mídia, no seu caso um programa especial da PBS sobre o monge trapista Thomas Merton.

"Eu sempre digo que, se não fosse pela TV, eu não seria padre jesuíta," disse.

Embora criado como católico juntamente com a sua irmã mais nova, Carolyn, Martin não cresceu em uma família devota – ele ia à missa e aos encontros dominicais, mas frequentava escolas públicas, enquanto uma estátua de São Judas comprada pelo correio guardada na sua gaveta de roupas íntimas ouvia as suas orações.

O documentário redirecionaria Martin, desviando-o dos Estados Unidos corporativos para a Companhia de Jesus um ano depois, trocando uma vida orientada para o lucro a uma vida de pobreza.

A criatividade de Deus

O seu caminho até os seus votos finais em 2009 não se assemelharia em nada a uma linha reta, mas sim a um exemplo da "implacabilidade de Deus e também da sua criatividade", muitas vezes retrocedendo para misturar a sua antiga vida com o seu novo chamado.

A regência de Martin no Quênia com o Serviço Jesuíta aos Refugiados faria com que ele aplicasse o seu histórico na Wharton/GE para proporcionar às mulheres das favelas de Nairóbi pequenas doações para abrir seus próprios negócios, uma experiência que Martin ainda chama de "o melhor trabalho que eu já tive, sem exceção".

E quando o seu provincial em 1994 parou os seus estudos teológicos durante um ano – uma notícia devastadora que quase levou Martin para fora da Companhia – ele acabou na revista America.

"Se eu não tivesse sido obediente, eu não seria tão feliz e tão produtivo quanto eu sou hoje", disse Martin.

O Martin pós-America, para onde ele voltou como editor-associado em 1999, colocou-o sob muitos radares midiáticos, mas para alguns, foi a sua paixão pelos santos que o lançou como uma proeminente figura católica.

O seu livro de memórias My Life With the Saints foi uma forma de compartilhar o seu amor pelos santos com os outros, convidando-os a revisitar as histórias únicas de pessoas "muitas vezes consideradas como quase de outro mundo", disse Martin ao NCR.

Farnham disse que My Life With the Saints, publicado pela Loyola Press e que vendeu mais de 100 mil cópias, mostrou que ele poderia comunicar os ensinamentos da Igreja de uma forma atraente para todas as pessoas, uma habilidade não observada apenas dentro da Igreja, mas também fora dela.

"Qualquer pessoa que pudesse fazer um livro chamado My Life With the Saints e pudesse fazer com que ele vendesse como ele o fez tinha algo único", disse Tauber, da HarperOne.

Aproximando-se de Martin para publicar os seus futuros livros, a editora secular lhe permitiria estender a sua plataforma ainda mais, um alcance que Farnham percebeu quando começou a receber telefonemas e e-mails de todo o mundo perguntando: "Você é a Ir. Janice desse livro?".

"E eu pensei: 'Meu Deus, esse livro chegou a todas as partes, ele realmente é conhecido em todos os lugares", disse ela.

Além dos livros e das aparições midiáticas, Martin ainda é, em primeiro lugar e acima de tudo, um padre. Ele continua na regularidade das missas na paróquia Santo Inácio. Ele ouve confissões, conduz retiros e oferece orientação espiritual.

Francófilo autodescrito, Martin tem acompanhado os Cavaleiros de Malta em várias de suas peregrinações anuais a Lourdes. Ele também é membro da companhia de teatro Labyrinth, à qual ele aconselhou uma peça apresentada em Nova York chamada Os Últimos Dias de Judas Iscariotes, dirigida por Philip Seymour Hoffman e que se tornou tema do livro de Martin A Jesuit Off-Broadway: Behind the Scenes With Faith, Doubt, Forgiveness, and More.

O companheiro jesuíta e amigo íntimo George Williams disse que o sucesso do ministério público de Martin vem das mesmas qualidades que fazem dele um sacerdote bom e santo: "Ele é uma pessoa muito orante, muito fiel, profundamente espiritual e traz com isso um senso de humor, tanto no ministério quanto na sua vida pessoal".

Mais do que tudo, ele continua sendo a mesma pessoa, nas telas e fora delas.

"Ele é quem ele é, não há um Jim Martin público e um Jim Martin privado. Eu acho que o que você vê na TV é genuíno", disse Williams.

"Se você conhecesse Jim Martin apenas através dos seus livros e depois você se encontrasse com Jim Martin, você diria: 'Sim, esse é Jim Martin'. Você não diria: 'Eu não posso acreditar que esse é o cara que escreveu os livros'", disse Modrys.

Farnham também vê um único Jim Martin e conta a si mesma entre os "800 amigos próximos" de Martin. Ela fica ansiosa para compartilhar que Martin ainda telefona sua mãe todos os dias e leva-a para suas aparições públicas, incluindo o evento da Fordham. E, a cada Quaresma, Martin telefona para seus amigos de faculdade, que continuam uma tradição de decidir o que ele vai abrir mão a cada ano.

"Não há dois Jims, ou cinco ou 10 Jims... Ele está crescendo naquele em quem Deus o está moldando", disse Farnham.

"Ele ama ser jesuíta, ele ama ser padre, ele ama ser uma figura pública. Ele acaba de encontrar o seu caminho", disse ela.

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