'Evangelho segundo São Mateus'. Vaticano reabilita o filme de Pasolini

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Por: Jonas | 24 Julho 2014

Dedicado por Pasolini “à memória querida, alegre e familiar de João XXIII”, há 50 anos, embora premiado e exitoso, ‘O Evangelho segundo São Mateus’ de Pier Paolo Pasolini, foi objeto de escândalo e censura. Hoje, a Santa Sé o qualifica como “obra de arte” e “a melhor jamais filmada” sobre Cristo. Seu diretor era um ateu fascinado pelo relato evangélico.

 
Fonte: http://goo.gl/ymVcqt  

A reportagem é publicada por Religión Digital, 23-07-2014. A tradução é do Cepat.

O prestigioso cineasta Pier Paolo Pasolini – assassinado em novembro de 1975, em circunstâncias nunca plenamente resolvidas – leu o Evangelho de São Mateus, quase por acaso, no ano de 1962, e ficou impactado.

Ateu e marxista, sempre sentiu atração pela religião: “Sou anticlerical (não tenho medo de dizer isso!), mas, sei que há em mim dois mil anos de cristianismo – dizia. Seria louco se negasse tal poderosa força que há em mim...”. E sobre o Evangelho, assegurava: “Nenhuma outra palavra poderá alcançar a altura poética do relato” bíblico.

Decidiu, então, fazer um filme com esse mesmo título bíblico (O Evangelho segundo São Mateus), para o que não lhe fazia falta um roteiro: bastava a tradução do texto em imagens. Ao estilo do neorrealismo então em moda, também não apelou para atores profissionais: o papel de Jesus foi feito por um jovem militante anarquista catalão, Enrique Irazoqui, ao passo que Maria – em sua velhice – foi interpretada pela mãe do próprio Pasolini. E assim se fez a repartição: amigos e parentes de amigos interpretaram discípulos e demais figuras do relato. Nenhum ator profissional nesta coprodução filmada na Sicília, com estilo simples, despojado, quase minimalista.

O filme, como se disse, não se afasta em nada do texto bíblico.

No entanto, no momento de sua estreia, em 1964, no Festival de Veneza, recebeu críticas de setores católicos conservadores, precisamente pelo demasiado “realismo”, pouco “sacro”, e foi censurado.

De certa forma, era também preconceito em relação ao seu realizador, que um ano antes havia sido condenado a quatro meses de prisão – condenação mais tarde revogada – por “ultraje à religião de Estado”, por outro filme seu – Ricotta – considerado blasfemo.

Porém, O Evangelho segundo São Mateus, dedicado por Pasolini “à memória querida, alegre e familiar de João XXIII”, foi bem recebido pelo público e obteve o prêmio especial do jurado de Veneza.

Os tempos mudam, e agora o filme de Pasolini recebeu o “perdão” oficial da Igreja. L’Osservatore Romano, órgão oficial da Santa Sé, define-o como “a melhor obra cinematográfica sobre Jesus”.

O filme de Pasolini se encontrava no arquivo da Filmoteca Vaticana há vários anos. Em uma revisão do material, o filme mostrou sinais de perda de luminosidade e intensidade das imagens, razão pela qual se tomou a decisão de digitalizá-lo.

Reconhecendo seu valor, o jornal católico afirma que “a humanidade febril e primitiva que o cineasta leva à tela, confere uma nova força ao verbo cristão que aparece neste contexto ainda mais atual, concreto e revolucionário”.

O Evangelho segundo São Mateus é uma obra de arte, provavelmente o melhor filme jamais realizado sobre Jesus”, lê-se no artigo de L’Osservatore, que anuncia que o filme rodado em 16 milímetros , foi digitalizado pela filmoteca do Vaticano.

Deste modo, Pasolini passa de intelectual herético a artista “canonizado”. Giovanni Maria Vian, diretor de L'Osservatore Romano, disse ao jornal italiano La Stampa que este reconhecimento a Pasolini é “um sinal da Igreja da misericórdia de Francisco”.

E, na verdade, é uma merecida homenagem à fidelidade do diretor italiano ao texto bíblico: sua versão foi a primeira não ‘hollywoodense’, edulcorada, da vida de Cristo, algo que se verifica tanto na seleção dos atores, como na simplicidade das conversas e a simplicidade da trama, reflexo exato do estilo do evangelista. O Jesus de Pasolini é humano, mas essa humanidade está no relato de Marcos: um Cristo que teme a morte e o sofrimento que o espera, que pede ao seu Pai que o evite – “afasta de mim esse cálice” -, mas nada disso é blasfêmia, mas, sim, fidelidade ao Evangelho.

Embora ateu, Pasolini reivindica Jesus como uma figura mítica-popular, um “resistente”, um revulsivo para o estilo de vida moderno. “Nada me parece tão oposto ao mundo moderno como aquele Cristo afável em seu coração, mas ‘violento’ em sua razão”. “Eu não acredito que Cristo seja filho de Deus – dizia Pasolini -, porque não sou crente. Mas, acredito que Cristo é divino: ou seja, acredito que nele a humanidade é elevada, rigorosa, ideal”.

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