''Apoiar a Palestina é a única maneira de alcançar a paz.'' Entrevista com Avraham B. Yehoshua

Mais Lidos

  • Elon Musk e o “fardo do nerd branco”

    LER MAIS
  • O Novo Ensino Médio e as novas desigualdades. Artigo de Roberto Rafael Dias da Silva

    LER MAIS
  • “A destruição das florestas não se deve apenas ao que comemos, mas também ao que vestimos”. Entrevista com Rubens Carvalho

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

26 Janeiro 2015

"Os palestinos não querem um califado islâmico e não têm objetivos religiosos extremos. Em última análise, o que eles pedem é aquilo a que todas as pessoas do mundo têm direito: ser cidadãos da própria pátria. Devemos lhes dar isso, como pede a maioria dos israelenses. O problema é como fazer isso."

A reportagem é de Fabio Scuto, publicada no jornal La Repubblica, 23-01-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

O escritor israelense Avraham B. Yehoshua vai direto ao núcleo da questão: o reconhecimento do Estado palestino. Professor emérito da Universidade de Haifa e professor visitante em Harvard, Oxford, Princeton e Chicago, Yehoshua pertence aos muitos israelenses que, nos últimos anos, criticaram fortemente as posições do governo de Benjamin Netanyahu, que contribuíram para o fracasso das negociações de paz.

O Parlamento italiano – depois da Grã-Bretanha, França, Espanha, Irlanda e Portugal – se prepara para votar o reconhecimento da Palestina. Yehoshua é um dos primeiros signatários israelense de um abaixo-assinado por esse reconhecimento, que o governo israelense considera um absurdo.

Eis a entrevista.

Por que é importante o reconhecimento do Estado palestino pelos parlamentos europeus?

A ausência de uma negociação, as demoras, a guerra em Gaza, a ampliação descontrolada dos assentamentos, tudo isso cria uma situação em que os palestinos, os moderados, aqueles que querem viver em paz naquele que é um quarto da Palestina histórica precisam de um encorajamento, depois que os Estados Unidos puxaram as rédeas por muito tempo e não conseguiram ter um único sucesso, não conseguiram fazer "desmantelar" nem mesmo um assentamento na Cisjordânia. Não estou falando das negociações de verdade, que são uma questão complexa, onde estão presentes muitos elementos, tais como o "Direito ao Retorno", que, sem dúvida, apresenta muitos problemas, mas, ao menos, de deter a construção de assentamentos, que é a ação mais elementar que Israel deveria fazer, para não criar situações irreversíveis.

Estamos no ponto de não retorno? Acabou a solução dos "dois Estados para dois povos"?

Eu realmente espero que ainda não tenhamos chegado a esse ponto, porque um Estado binacional seria uma catástrofe para ambos os povos. Vejamos o que está acontecendo hoje nos Estados binacionais: um caos atroz nos Estados árabes. Por isso, justamente os palestinos que ainda acreditam em uma negociação e ainda acreditam em um Estado palestino são aqueles que precisam de um encorajamento mais concreto dos europeus, de um reconhecimento do Estado palestino.

Então você concorda que a comunidade internacional, a Europa e a Itália, continuem dedicando atenção ao que acontece no Oriente Médio?

Mas é claro. Olhe para o que acontece na Síria, coisas terríveis, e lá é praticamente impossível fazer qualquer coisa. Mas a questão palestina, que é uma das razões do caos do Oriente Médio, não única, mas uma das tantas que inflamam os extremismos, é resolvível, no entanto. Naturalmente, a Europa não pode criar o Estado Palestino, que pode ser constituído apenas por meio de uma negociação entre Israel e os palestinos, com condições que garantam a segurança de Israel, mas pode encorajar esse processo com um ato simbólico de reconhecimento.

A solução do conflito entre Israel e os palestinos pode oferecer uma maior possibilidade de se defrontar outros conflitos que assolam o Oriente Médio, como os com o Is ou a Al-Qaeda?

Eu não sei. Parece que nem mesmo aqueles que combatem, sabem a que o conflito diz respeito. Quem sabe realmente o que querem o Is e a Al-Qaeda? São conflitos muito complexos, em que não está claro onde está o bem e onde está o mal, nem no Iraque, nem na Síria, onde não é possível saber o que acontece. O que se sabe, no entanto, é o que querem os palestinos: eles não querem um califado islâmico, não têm objetivos religiosos extremos. O que eles querem, no fim, é aquilo que todas as pessoas do mundo têm direito: ser cidadão na própria pátria. Devemos lhes dar isso, e digo mais: 50-60% dos israelenses concordam. O problema é como fazer isso.

Se é verdade o que você diz, o que impede a sua realização?

O medo de que possa acontecer o que aconteceu com a retirada de Gaza. Na época, houve uma retirada israelense incondicional da Faixa (o que levou a três sucessivas operações militares em nove anos. n.d.r.), enquanto agora estamos falando de uma retirada com garantias, com contingentes israelenses que permaneceriam no local: a coordenação entre o Exército israelense e as forças de segurança palestinas deram ótimas provas há anos. Não há terrorismo, e, se há incidentes, trata-se de casos esporádicos que ocorreram principalmente nos Territórios Palestinos, que ainda estão sob o domínio israelense. Vimos Abu Mazen que foi a Paris para expressar a sua solidariedade e marchou ao lado do primeiro-ministro de Israel. O terrorismo não está na sua pauta, ele não combate os judeus onde quer que estejam e não representa o extremismo islâmico. Ele tem um objetivo claro e preciso: obter o seu pequeno Estado.

A dois meses de uma votação política decisiva, Israel se encontra à beira da paz ou da guerra?

Israel se encontra à beira de uma mudança, à beira do fim da chantagem dos colonos extremistas de direita, à beira da possibilidade de mudar de rota, de voltar ao diálogo que houve no passado. Não estamos mais na época em que ninguém no mundo árabe queria falar conosco. Temos em cima da mesa a proposta da Liga Árabe: é preciso apenas superar o obstáculo do "Direito ao Retorno", que, para nós, é impossível aceitar (o retorno dos refugiados árabes ao território de Israel, n.d.r).

Em troca da renúncia aos refugiados palestinos ao retorno, você estaria disposto a renunciar à Lei do Retorno para os judeus?

Não, porque se trata de duas coisas que não têm nada em comum. A Lei do Retorno não tem nenhuma ligação com os árabes. Nós precisamos da Lei do Retorno, porque só assim podemos garantir a possibilidade de acolher todos os judeus que precisam: olhe para o que acontece neste momento na França. O Direito ao Retorno dos palestinos não pode ser estendido ao regresso dos refugiados a Israel, mas, no que se refere ao retorno dentro das fronteiras do Estado Palestino, eles terão todo o direito de voltar. Lá será aplicada a sua lei do retorno.

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

''Apoiar a Palestina é a única maneira de alcançar a paz.'' Entrevista com Avraham B. Yehoshua - Instituto Humanitas Unisinos - IHU